Em 2022, a expressão “velhice” passa a ser utilizada na 11ª Classificação Internacional de Doença e especialistas na saúde do idoso posicionam-se contra a decisão da OMS.
Na mais nova atualização da Classificação Internacional de Doenças (CID), a Organização Mundial de Saúde prevê a inclusão do termo “velhice” para o início do ano de 2022. A CID é um catálogo de patologias utilizado por diversos profissionais da saúde para especificar doenças e seus possíveis tratamentos. O motivo pelo qual defende a OMS para inclusão do termo é de normatizar mortes pelo avanço da idade, o que deixou a comunidade médica apreensiva com as eventuais consequências de integrar envelhecimento em um catálogo de doenças.
Para o geriatra e médico da família, Cláudio Viana Silveira Filho, um dos riscos da nova classificação é de que organizações e sociedades vinculadas ao cuidado do idoso passem a ver velhice como motivo de todas as doenças e percam os reais motivos dos acometimentos epidemiológicos, “Colocar todos os idosos em um único grupo sem analisar suas particularidades é prejudicial ao próprio tratamento da saúde desses pacientes” afirma o médico.
Ao defender seu posicionamento, o Dr. Cláudio Viana comenta que no setor de geriatria o conceito de saúde é diferente comparado a outras áreas da medicina. Conforme exposto por ele, a saúde do idoso não significa a ausência de doenças e sim a capacidade funcional do paciente, ou seja, o determinante de saúde na geriatria é a capacidade do corpo em funcionar de forma sozinha.
A inclusão do termo
A partir do dia 1º de janeiro de 2022 passa a vigorar a atualização do código R-G54 para o código MG2A, com o termo “velhice” substituindo o termo “senilidade”. A palavra antecessora, pela OMS, significa as patologias vinda das alterações fisiológicas pelo esforço da idade. Agora com nova palavra, passa a generalizar quaisquer causas de doença das pessoas com 60 anos completos ou mais.
O objetivo pelo qual a Organização Mundial da Saúde defende a substituição dos termos, é de diminuir a burocracia obituária dos falecimentos causados pelo avanço da idade. A decisão ocorreu após a morte do Príncipe Philip, o qual morreu em abril de 2021 com 99 anos, e em seu atestado de óbito decretava “morte por idade avançada”.
Segundo o Dr. Cláudio Viana, a decisão da instituição em atualizar o código para MG2A é em decorrência das mudanças demográficas que os países vêm enfrentando nos últimos anos. O geriatra explica que a mudança da pirâmide etária, ligada com a diminuição no número de nascidos vivos e também o aumento da carga epidemiológica em idosos com mais de 80 anos, é a razão da OMS normatizar a morte por envelhecimento.
Conforme os dados levantados em 2020 pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o número de idosos no Brasil com 60 anos completos ou mais chegou a contabilizar 37,7 milhões de habitantes, correspondendo a 17,7% da população geral. Na mesma pesquisa, a Dieese também aponta que pessoas com mais de 60 anos já superaram o número de crianças com até 9 anos de vida.
A aposentada e youtuber culinária, Ana Maria Selmi Sanches, de 62 anos, fala sobre seu descontentamento pela nova classificação da OMS, sendo para ela “algo ultrajante aos idosos”. No depoimento da Ana, os melhores anos da vida começam a partir dos 60, significando o oposto de doença “A partir dos 60 anos comecei a ter liberdade para fazer minhas próprias escolhas, não tinha mais a preocupação de trabalhar para não passar fome, pude recomeçar a minha vida” complementa Ana Maria.
Campanha “Velhice não é doença!”
A campanha denominada “Velhice não é doença”, foi feita por diferentes profissionais da área da saúde e apoiada por representantes das sociedades civis, com o objetivo pedir aos representantes dos órgãos públicos brasileiros emitir solicitações à OMS para que a inclusão do termo não se consolide.
Em agosto foi realizado o evento “As novas demandas do envelhecimento e a CID-11: Perspectivas das Américas”, feito pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS), onde foram debatidos os propósitos da inclusão de velhice na CID-11. Durante o evento os participantes brasileiros mostraram forte oposição à decisão da OMS, adotando a campanha “Velhice não é doença”. O principal pedido dos especialistas brasileiros era de que a instituição reconsiderasse a publicação do novo código.
O mais recente pedido, contrário à troca dos termos, foi feito pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), na qual solicita que a OMS abra uma consulta com todos seus países membros antes da publicação da CID-11. O Ofício enviado pelo CNS considera que enquadrar envelhecimento como doença pode aumentar o estigma social e os preconceitos voltados aos idosos. Além disso, o documento aponta as possíveis interferências nas pesquisas voltadas ao tratamentos de doenças vindas do avanço da idade, como também, dificultar a coleta de dados epidemiológicos.
Texto por: Alex Dolgan
Imagem: Alex Dolgan