As maiores filas são para transplante de rim, córneas e fígado
De acordo com dados da Secretaria da Saúde do Paraná, o Estado tem o maior número de doação de órgãos por milhão de população do País (pmp). É o estado líder nacional de transplante de rins e o terceiro em transplantes de fígado. Segundo a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), o Paraná registra 42,3 pmp, seguido de Santa Catarina com 40,7 pmp e Rondônia com 40,5 pmp.
Karoline Fernandes, de 22 anos, mora em Ponta Grossa e fez um transplante de rim aos 6 anos de idade. Ela começou a ter os primeiros sintomas de insuficiência renal quando tinha 4 anos. Do período em que a doença foi descoberta até o transplante foram dois anos de idas e vindas ao hospital; na maior parte desse tempo ela ficou internada realizando diálise peritoneal.
O rim foi doado pela sua mãe. “No momento em que minha mãe soube que era possível doar o rim dela para mim, ela não pensou duas vezes, logo fez os exames necessários e passou no teste de compatibilidade”.
Karoline explica que o processo de encontrar um doador é muito mais rápido se um familiar se dispuser a doar, como foi seu caso. Segundo ela, a fila de espera é muito demorada porque não é só preciso ter quem doe e quem receba, é preciso ter compatibilidade. Por isso, Karoline ressalta a importância da doação de órgãos, que está na possibilidade de dar mais uma chance de vida a alguém, pois muitas vezes o transplante é a última saída de um paciente. Antes disso, são feitos diversos tratamentos e apenas em extrema necessidade é realizado o transplante.
Luiz Sergio Pedroso, de Irati, teve glomerulonefrite nos rins e precisou de um transplante. Entre o diagnóstico até a hemodiálise demorou cerca de seis anos; após isso ele fez nove meses de hemodiálise, três vezes na semana, quatro horas por dia na máquina.
Durante esses anos ele foi chamado ao hospital para transplantar, mas na hora não foi compatível. Luiz tem mais três irmãos, todos com o mesmo tipo sanguíneo que ele. “Meu irmão tinha 100% de compatibilidade, mas faleceu em um acidente de trânsito e não houve chance de aproveitar os órgãos”. Sua outra irmã, que tinha 50% de compatibilidade, tinha problemas no útero e teria que fazer cirurgia para depois realizar o transplante. Em conjunto com a médica, a decisão foi realizar exames para o transplante com a terceira irmã, que tinha 25% de compatibilidade, porém na semana que estavam fazendo os exames ele foi chamado para concorrer ao rim de um possível doador, e assim realizou o transplante em maio de 2014. Hoje, 10 anos após o transplante, Pedroso nunca teve problemas com a rejeição do órgão e faz exames a cada seis meses para monitorar, além dos cuidados com medicamentos e alimentação. Ele afirma que a doação é a última chance de sobrevivência de muitas pessoas. “Para os familiares do doador, ver as pessoas transplantadas e bem com os órgãos de seu ente querido costuma ser muito gratificante também”, acrescenta.
Pedroso considera que a doação de órgãos é um ato generoso que pode salvar até oito vidas e melhorar a qualidade de vida, porém existe uma escassez de doadores, por isso a conscientização é essencial. “A desinformação leva a muitas negações de órgãos, é importante que as pessoas conversem com seus familiares sobre o desejo de doar”, ressalta.
Incentivo às doações
Dados do Registro Brasileiro de Transplantes apontam que o Paraná possui a menor taxa de recusa familiar para doação do Brasil, com 27%, enquanto a média brasileira foi de 42%. O coordenador da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos (CIHDOTT) do Hospital Universitário (HU), Guilherme Arcaro, destaca a importância de que o desejo de ser doador seja compartilhado com a família em vida, visto que no Brasil a retirada de órgãos só pode ser realizada após a autorização familiar.
A falta de conhecimento sobre a doação de órgãos faz com que muitas famílias recusem a doação de órgão de um ente querido. Arcaro explica que muitas famílias têm dúvida sobre a declaração da morte encefálica (ME), pela confusão quanto ao estado vegetativo. “A ME é um diagnóstico irreversível de que não existe funcionamento no cérebro, enquanto no estado vegetativo, apesar de existir uma disfunção cerebral severa, existem indícios de funcionamento, que são detectáveis nos exames clínicos e complementares realizados durante a investigação da ME”.
Em Ponta Grossa, todos os hospitais devem ter Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante – CIHDOTTs instituídas, com composição de acordo com o número de óbitos ocorridos anualmente. “Os hospitais possuem profissionais que realizam diariamente busca ativa de pacientes em estado de coma arreativo ou déficit neurológico grave na busca pelo diagnóstico precoce de morte cerebral, procurando oportunizar às famílias a possibilidade de salvar vidas com o aceite da doação”, afirma o coordenador. Segundo ele, no Paraná existe um Sistema Estadual de Transplantes que trabalha em contato diário com as CIHDOTTs certificando que o processo de identificação de morte encefálica e as doações de órgãos ocorram sem imprevistos.”Nos últimos anos, o Paraná tem mantido este destaque, devemos isso também à solidariedade dos paranaenses”.
Sobre a doação entre vivos, Guilherme ressalta que ela só acontece se não representar nenhum problema de saúde para a pessoa que doa e que só podem ser doados órgãos duplos como o rim, ou partes de um órgão como pâncreas e fígado, ou ainda, tecidos como a medula óssea.
Pela legislação vigente, quem autoriza a doação em caso de morte encefálica é a família do cidadão. Além de deixar a família ciente do desejo de doar, também é possível manifestar sua vontade por meio de uma autorização eletrônica oficial que pode ser feita gratuitamente pelo site www.aedo.org.br.
Por meio desse sistema é possível escolher quais órgãos deseja doar. O documento passa por alguns processos para verificar a identidade do cidadão, como videoconferência e assinatura digital, e depois fica disponível para consulta pelo CPF do falecido, feita pelos responsáveis do Sistema Nacional de Transplantes, do Ministério da Saúde. Realizada essa autorização, em caso de necessidade, o médico poderá acessar a declaração e apresentar o desejo do paciente em óbito para a família que, caso não saiba, fica ciente, o que facilita a tomada de decisão e a autorização da doação.
Por Amanda Grzebielucka e Pietra Gasparini