ADI 7769 coloca em risco futuro das APAEs e escolas especializadas no Paraná

Ação questiona leis do estado que garantem o funcionamento de instituições de ensino para pessoas com deficiência; especialistas alertam para a ameaça ao direito de escolha das famílias.

                                                                                                      Por Lorena Santana

Famílias e usuários marcham a favor da APAE. Créditos: Lorena Santana

A ADI 7769 é uma Ação Direta de Inconstitucionalidade que está em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF) e ainda não tem prazo para ser julgada. Trata-se de uma ação movida pela Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down, com o objetivo de questionar a constitucionalidade de leis estaduais do Paraná que permitem a existência e o funcionamento de escolas especializadas mantidas por APAEs (Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais) e outras associações similares. 

Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) é uma ação judicial proposta no Supremo Tribunal Federal (STF) para declarar inconstitucional uma lei ou ato normativo federal ou estadual, ou seja, que ele contraria a Constituição Federal. A federação questiona duas leis do Paraná: A Lei 17.656/2013, que institui o programa “Todos Iguais pela Educação”. E a Lei 18.419/2015, o Estatuto da Pessoa com Deficiência do Estado. 

A ADI 7769 sustenta que essas leis violam princípios constitucionais ao permitir que pessoas com deficiência estudem em instituições exclusivas (especializadas), em vez de serem inseridas no ensino regular. Por essa linha, a ação defende que a matrícula deva ser exclusivamente nas escolas regulares. Uma interpretação que, na prática, pode tornar inviável o funcionamento financeiro dessas instituições especializadas.

Em nota, a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down se manifesta:

“A ADI 7796 não quer acabar com as APAEs e nem com outras instituições que atendem pessoas com deficiência. O objetivo da ação é garantir que essas organizações atuem de acordo com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que tem força de lei no Brasil. 

Isso significa promover um modelo de inclusão, no qual as pessoas com deficiência tenham acesso à educação e aos serviços em ambientes acessíveis e sem segregação, sempre respeitando as suas necessidades.

As APAEs e outras entidades podem e devem continuar oferecendo o Atendimento Educacional Especializado (AEE), apoiando os estudantes em suas trajetórias escolares e contribuindo para a inclusão nas escolas regulares. O que se busca é que esse atendimento complemente, e não substitua, o direito à educação inclusiva.

A ideia é fortalecer os direitos das pessoas com deficiência, e não enfraquecer o trabalho de nenhuma instituição.”

 

Alexandre Ramôa, pai de um autista que frequenta a APAE, declara: “Essa ação supõe tirar recursos necessários às APAES e outras instituições que, em casos mais severos de deficiência, são locais mais apropriados para o desenvolvimento dessas crianças, jovens e adultos. São PCDs e famílias que não podem esperar as escolas regulares se adaptarem para “um dia” prestar um bom serviço. As famílias devem ter o poder de escolha, não precisa ser um ou outro. Se meu filho pudesse estar na escola regular, obviamente seria muito mais simples para nós, até pela quantidade de oferta de vagas e opções de escolas. Mas não é o caso. Lutem por verbas para todos, isso sim fortaleceria a inclusão.”

 

A APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) nasceu em 1954 no Rio de Janeiro, com o objetivo de promover a atenção integral às pessoas com deficiência, com foco principal na deficiência intelectual e múltipla.  Ela promove desde o apoio às famílias e orientação, até atendimentos médicos e odontológicos, reabilitação, desenvolvimento de habilidades sociais, e inserção no mercado de trabalho. 

As APAEs recebem dinheiro de fontes diversas, incluindo doações da sociedade, recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (Fundeb) e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), convênios com o SUS e outros fundos públicos como o de Assistência Social, e também de emendas parlamentares e repasses de governos estaduais e municipais.

No Estado do Paraná, a associação iniciou a partir da década de 1960, atualmente são 343 escolas especializadas, entre elas as APAEs, que atendem mais de 40 mil estudantes com deficiência em todo o Estado. Já no Conselho Regional de APAEs de Ponta Grossa são atendidos 2.277 alunos nas escolas especializadas.

 

Laerte Bittencourt Filho, presidente da APAE de Ponta Grossa, argumenta sobre os riscos do fechamento da APAE. Segundo ele, uma criança com deficiência que é assistida em uma sala especializada com mais oito crianças não se desenvolverá da mesma forma em uma sala com quarenta alunos por mais que haja uma monitora específica. “Há um perigo na ameaça do fechamento especialmente para os que adquiriram certo desenvolvimento. Essa inclusão será feita de maneira abrupta, sem planejamento e estrutura, com o claro prejuízo para os envolvidos”, declara o presidente.

 

A psicóloga Marina Lemos analisa a situação e afirma que a defesa de uma inclusão forçada, tende a danificar a progressão dos envolvidos. “A APAE foca no desenvolvimento especializado dos indivíduos. Os profissionais capacitados promovem o desenvolvimento integral, não só no sentido acadêmico, mas no sentido da autonomia, para que eles não dependam mais de um responsável e conquistem sua independência para situações básicas do dia a dia”, explica Marina. 

 

Andreia Florão relata que seu filho Matheus de quatro anos frequenta a APAE e uma escola regular. O nível de suporte de autismo que ele apresenta permite que ele aproveite de maneira integral a oferta das duas instituições. Porém ela afirma que a luta que ela adota não é só por si, mas por todos os outros usuários da instituição. “O fechamento não ameaça só as crianças mas também os adultos que são assistidos e profissionalizados pela APAE. Lá dentro eles são ensinados a viver apesar das limitações. E é por isso que eu sou contra o fechamento”, defende Andreia.

 

A manifestação começou na Praça Barão de Guaraúna e seguiu até o Parque Ambiental. Créditos: Lorena Santana.

 

Em Ponta Grossa, no dia 28 de agosto, foi mobilizada uma caminhada contra a ADI, reunindo mais de 80 pessoas, entre elas familiares, funcionários e assistidos da APAE e da APADEV. 

 

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