Boletim Covid-19 – informação contra a pandemia – uma produção do curso de Jornalismo da UEPG.
Reportagem: Amanda Martins e Kathleen Schenberger Edição: Daniela Valenga Professores responsáveis: Cíntia Xavier e Paula Rocha
Produção jornalística de extensão realizada à distância e inteiramente online, em respeito às normas de segurança e isolamento social.
Imprensa: A veiculação deste boletim é livre e gratuita, desde que mantida sua integridade e informados os créditos de produção.
Boletim Covid-19 – informação contra a pandemia – uma produção do curso de Jornalismo da UEPG.
Reportagem: Heryvelton Martins Edição: Maria Eduarda Eurich Professores responsáveis: Marcelo Bronosky e Muriel Amaral
Produção jornalística de extensão realizada à distância e inteiramente online, em respeito às normas de segurança e isolamento social.
Imprensa: A veiculação deste boletim é livre e gratuita, desde que mantida sua integridade e informados os créditos de produção.
Confira a terceira parte da série de reportagens “Roceiras”, produzida por Gabriella de Barros para seu projeto de conclusão de curso, finalizado em 2021.
Que as mulheres trabalham mais que os homens não é novidade, de acordo com o Relatório da Pesquisa Sem Parar, realizada pela Sempreviva Organização Feminista (SOF) e a Gênero e Número. Na participação familiar as mulheres rurais ocupam 50%, enquanto as mulheres da área urbana correspondem a 46%. Na pandemia do novo coronavírus, as mulheres representavam 44% daquelas que afirmaram que a pandemia comprometeu seu sustento.
Entre as mulheres entrevistadas na pesquisa, 47% afirmaram ser responsáveis pelo cuidado de outra pessoa e 57% delas relataram ser responsáveis por filhos de até 12 anos. Os dados indicam que as mulheres passam mais tempo no cuidado de outras pessoas, sem a divisão dessa responsabilidade entre as pessoas da família. “A pesquisa indica que 42% das mulheres responsáveis pelo cuidado de outra pessoa o fazem sem apoio de pessoas de fora do núcleo familiar”, aponta o Relatório.
O trabalho das mulheres em casa se intensificou com a pandemia. Devido ao fechamento das escolas, muitas tiveram que dividir seu tempo entre os afazeres domésticos, o trabalho na lavoura e o cuidado com os filhos.
Os resultados da pesquisa chamam a atenção sobre a organização do trabalho doméstico na relação com o trabalho remunerado. Os dados mostram que 65,4% das mulheres disseram que a responsabilidade com o trabalho doméstico e de cuidado dificulta a realização do trabalho remunerado. No caso das mulheres rurais, o trabalho passa a ser parcial, já que elas precisam estar presentes em ambos.
Para a advogada Jeaneth, o direito da mulher mais ignorado é o vínculo empregatício: “O agravante é que, ao não ter Carteira de Trabalho assinada e Previdência Social, se afastam todos os demais direitos da trabalhadora”, esclarece. As mulheres acabam acumulando essas cargas porque os serviços realizados por elas são considerados como uma “ajuda” ao cônjuge.
De acordo com Sônia Maria Marques, agente comunitária da comunidade de Queimadas, a maioria das mulheres rurais trabalham como agricultoras, apenas as aposentadas já deixaram a lavoura para trás. O plantio de fumo é o mais lucrativo para as famílias se manterem: “É uma fonte de vida deles no interior, entra todo tipo de coisa para eles associarem junto com o fumo, como a lavoura e a horta. Mas por conta da venda os agricultores optam pelo fumo, deixando outros trabalhos de lado. O fumo rende mais, mas tem muito gasto, é a compra de lenha, é a luz, poucas famílias pagam menos do que 500 reais de luz”. A agente comunitária comenta que algumas famílias acabam se endividando por conta de empréstimos, para manterem as estufas e a plantação.
O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palmeira foi questionado sobre os serviços que prestam aos agricultores. “Oferecemos serviços como encaminhamentos ao INSS, geração de documentos, encaminhamentos de projetos para aquisição de crédito rural”, esclarece Vilmar Sergiki, presidente do sindicato.
Sobre a atuação do sindicato junto às mulheres, Vilmar Sergiki relata que são oferecidos benefícios na área da saúde, contando com uma médica que atende casos de neuropatia. “Nos preocupamos com a saúde e bem estar das mulheres, promovemos encontros e dias de beleza, palestras sobre cuidados, fazemos cursos para que elas consigam ter uma renda extra”.
De acordo com ele, os encontros diminuíram, principalmente com a pandemia de covid-19, mas são realizados cursos durante o ano. No mês de março, sempre foi realizado um encontro maior em homenagem ao Dia Internacional da Mulher (8 de março). No sistema do Sindicato estão cadastradas 1.547 mulheres, mas nem todas estão em dia com a entidade.
Estatísticas da ONU realçam que as mulheres rurais são um quarto da população mundial e uma em cada três mulheres com emprego no mundo trabalha no setor da agricultura. Apesar de grande representatividade, muito do trabalho desenvolvido pelas mulheres continua sendo invisível e não pago. Segundo a ONU, as trabalhadoras rurais estão piores do que homens rurais ou mulheres que vivem em cidades em quase todos os indicadores.
A advogada, Jeaneth Nunes, explica quais são os direitos assegurados às mulheres rurais: “A trabalhadora rural é uma cidadã que goza das prerrogativas constitucionais, dentre elas os direitos trabalhistas e previdenciários, previstos no artigo 7 da Constituição Federal, carteira assinada, salário mínimo, jornada de 44 horas semanais, décimo terceiro, férias acrescidas de 1/3 e FGTS”.
Trabalho doméstico
Mulheres como Andreia, Andréa e Maristela dividem os dias entre a lavoura e a casa, cuidam das hortas e das criações de animais. O marido de Andréa Baggio é caminhoneiro e passa dias viajando, ela administra a casa com a companhia dos dois filhos, Ana Flávia (13) e Gabriel (8). Euclides já passou mais de 90 dias fora, enquanto ela cuidava dos filhos, da casa e do trabalho na lavoura.
Com a lavoura e sem ajuda em casa, Andréa tem uma rotina cansativa: “Chega de tarde, você não quer mais nada, mas chega na casa tem louça, bagunça, filho com fome, você quer ir lá, tomar banho, deitar e esquecer. No outro dia 6 horas ou antes já tem que levantar”.
Sua colega de profissão, Andreia do Nascimento, acredita que as mulheres rurais acabam trabalhando mais que os homens. “Por mais que o trabalho do homem seja mais pesado, a mulher se desdobra, faz duas, três coisas ao mesmo tempo, às vezes alguma coisa não sai bem feita porque precisa estar de um lado pro outro né”, comenta.
Andreia do Nascimento tem a mesma visão que sua colega sobre a sobrecarga de trabalho. Para ela, as mulheres trabalham mais e acabam acumulando funções. “A gente sempre fala que a mulher trabalha mais que o homem porque a gente tem que ir junto pra roça, tem que ajudar em tudo o que tem de serviço lá da roça e a gente tem a casa. Então a gente trabalha mesmo, mais puxado que os homens”, avalia.
Quando Andreia e seu marido, Mauro, não estão trabalhando no fumo, ele trabalha de pedreiro e ela fica cuidando da casa e dos animais, porcos, galinhas e carneiros. Jaíne (15), que é a filha mais nova, ajuda no trabalho de casa quando os pais estão na lavoura, fazendo o almoço e limpando. A filha mais velha de Andreia, Jaqueline (21), se mudou para Palmeira (PR) junto com o ex-marido para trabalhar em uma empresa, na época ela não queria trabalhar na lavoura e buscou outras alternativas.
“Aqui no interior, praticamente todas as mulheres vão junto para a roça, quem não tem um que fique na casa fazendo uma comida, tem que largar de lá e vim fazer, mais ou menos a mesma rotina de todo mundo”, explica Andreia. Ela também é ministra e ajuda a cuidar da igreja de Vileiros. As celebrações são no domingo pela manhã ou durante a semana no período da tarde.
Andreia considera que é complicado conciliar tudo, porque precisa deixar de realizar um serviço para fazer outro: “Tem missa no meio da semana e se a gente tá trabalhando no fumo ou em casa e tem missa e é o dia da gente ajudar o padre, tem que deixar o serviço e ir, não tem o que fazer”.
“Chefas” de família
De acordo com dados fornecidos pela Assistência Social de Palmeira (PR), a área rural possuí 1.340 mulheres cadastradas no CADÚNICO e CRAS – Centro de referência de Assistência Social e, dentre estas, 717 são mulheres responsáveis por familiares. Ao todo são 598 famílias lideradas por mulheres com renda per capita de até meio salário mínimo e 119 famílias cuja responsável familiar é mulher, com renda superior a meio salário mínimo. Além disso, 71 famílias possuem renda de extrema pobreza e 271 são beneficiárias do Programa Bolsa Família.
O Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF), oferecido pelo CRAS, faz o acompanhamento de 101 famílias por meio de serviços da Assistência Social, sendo 29 famílias de mulheres que residem no interior. Já o Família Nossa Gente (antigo Família Paranaense), programa do Governo do Paraná para reduzir a pobreza no Estado, faz o acompanhamento de 92 famílias, sendo 88 na área rural, e dentre estas, 83 são chefiadas por mulheres.
No Cartão Cidadania, criado pelo governo federal, que possui benefícios trabalhistas e/ou sociais, estão cadastradas 1.695 famílias que recebem ou já receberam o cartão cidadania. Aproximadamente 1.525 delas são representadas por mulheres quem vão para o atendimento, das quais, cerca de 600 são mulheres que residem no interior.
O Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculo, vinculado ao CRAS, prevê o atendimento de 150 pessoas, sendo que 90% são mulheres, e é ofertado nas localidades de Boa Vista, Encruzilhada, Faxinal dos Mineiros, Limeira, Queimadas e Guarauninha. O serviço está parcialmente suspenso por conta da pandemia.
Boletim Covid-19 – informação contra a pandemia – uma produção do curso de Jornalismo da UEPG.
Reportagem: Kathleen Schenberger Edição: Reinaldo Dos Santos Professores responsáveis: Marcelo Bronosky e Muriel Emídio Pessoa do Amaral
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Imprensa: A veiculação deste boletim é livre e gratuita, desde que mantida sua integridade e informados os créditos de produção.
Boletim Covid-19 – informação contra a pandemia – uma produção do curso de Jornalismo da UEPG.
Reportagem: Eder Carlos Edição: Daniela Valenga Professores responsáveis: Cíntia Xavier e Rafael Kondlatsch
Produção jornalística de extensão realizada à distância e inteiramente online, em respeito às normas de segurança e isolamento social.
Imprensa: A veiculação deste boletim é livre e gratuita, desde que mantida sua integridade e informados os créditos de produção.
Boletim Covid-19 – informação contra a pandemia – uma produção do curso de Jornalismo da UEPG.
Reportagem: Daniela Valenga Edição: Eder Carlos Professores responsáveis: Karina Woitowicz e Rafael Kondlatsch
Produção jornalística de extensão realizada à distância e inteiramente online, em respeito às normas de segurança e isolamento social.
Imprensa: A veiculação deste boletim é livre e gratuita, desde que mantida sua integridade e informados os créditos de produção.
Confira a segunda parte da série de reportagens “Roceiras”, produzida por Gabriella de Barros para seu projeto de conclusão de curso, finalizado em 2021.
Cibele Maffini foi uma das ginecologistas que passou por plantões na cidade de Palmeira, Paraná. Plantonista da obstetrícia na Santa Casa, atendeu casos da cidade e do interior. De acordo com a ginecologista, o número médio de nascimentos na maternidade era de dois a três por 24 horas e, entre as gestantes, havia as fumicultoras. Em seu consultório privado, em Palmeira, Cibele atende aproximadamente 10 pacientes fumicultoras. A médica explica quais são os principais problemas causados na saúde reprodutiva da mulher rural: “Primeiro, a cultura em si. O tabaco é por si só uma planta nociva e principalmente na colheita o contato com as folhas é grande. Nas estufas de fumo é ainda mais intenso, pois no processo de secagem existem substâncias possivelmente tóxicas liberadas pelo fumo que são inaladas e não é raro algumas pacientes relatarem enjoos e tonturas”. Segundo a médica, a literatura medica traz muito sobre os efeitos nocivos do tabaco fumado, mas ainda é pobre em evidências em relação aos efeitos do contato com a folha de tabaco na fumicultura. Existe uma associação com o trabalho de parto prematuro, maior incidência de depressão e suicídio, abortamentos e irregularidades menstruais, entre outros aspectos a serem investigados. Para ela, ainda são poucas as pesquisas sobre o tema e é preciso avançar nesses estudos. “Outro problema são os inseticidas e herbicidas utilizados”, explica.
De acordo com a pesquisa “Sintomas de depressão em mulheres rurais: fatores sociodemográficos, econômicos, comportamentais e reprodutivos“, de 2017, que produziu entrevistas com 280 mulheres da área rural do município de Uberaba-MG, alguns fatores que levam as mulheres rurais a serem mais propensas à depressão e à ansiedade estão relacionados à exposição a determinadas circunstâncias, condições e comportamentos que podem torná-las mais vulneráveis à depressão. Alguns fatores são: aumento da idade, baixa escolaridade, divórcio, violência física, pequena rede social, pouco apoio social, relacionamento regular com familiares, estresse e intenção suicida. “Existem fatores estressores que são únicos do ambiente rural, como isolamento, pouco contato social, limitado acesso aos serviços de saúde e profissionais de saúde, a distância, estradas em más condições, despesas de transportes, declínio da economia agrícola, renda irregular e desvantagens financeira e educacional”, descrevem as autoras do estudo.
Como visto no gráfico abaixo, a região Sul possui um percentual alto de pessoas diagnosticadas com depressão. De acordo com o IBGE, a prevalência é de 10,7% na área urbana e 7,6% na área rural. Também foi verificado que as mulheres são o maior alvo da depressão, 14,7% no sexo feminino e 5,1% do sexo masculino. A pesquisa de 2017 constata também que, das 280 entrevistadas, em média 8,6% moravam com os companheiros, mas classificavam sua convivência como ruim, chegando em média a 20,6%.
Assim como o problema da depressão, a pesquisa mostra que, das 280 mulheres, 10,6% delas já sofreram abortos. A ginecologista, Cibele, quando questionada sobre os riscos de abortos em mulheres rurais, observa: “Acredito ser possível um maior índice de abortos devido à exposição ao tabaco e aos inseticidas e herbicidas sem o uso de proteção adequada”.
A agente comunitária, Sônia Maria Marques, comenta sobre problemas de saúde cotidianos nas mulheres no campo: “Começamos a ver problemas de coluna, problema de útero e ovário, casos de mulheres que abortam e têm dificuldade para engravidar”. De acordo com a pesquisa realizada pelo IBGE, em 2019, além da depressão, o câncer é uma das doenças que mais aparece e que mais acomete as mulheres. “Foram destacados os seguintes tipos de câncer: mama (26,8%), próstata (16,0%), colo de útero (11,6%) e melanoma (9,9%). O câncer de mama foi relatado por 43,5% das mulheres nos casos de câncer no primeiro diagnóstico, e o de colo de útero por 19,0% delas”, estima.
Na Unidade de Saúde, alguns exames direcionados às mulheres estão disponíveis. Os exames laboratoriais que elas têm acesso são o preventivo e o o teste rápido que é feito para testagem de hepatites, sífilis e HIV, em que os resultados saem na hora. Para as gestantes também é feita a coleta do teste da mãezinha – é um exame que tem como objetivo detectar, prevenir e tratar doenças como a Anemia Falciforme e a Talassemia Major nas gestantes – e são realizados também os exames clínicos. Se houver necessidade de um exame complementar, é feita a solicitação.
“O que não for coberto pelo SUS, dentre os exames, elas precisam ir até Palmeira para pagar o exame, mas a coleta é feita na Unidade mesmo no dia especifico que o laboratório vai para realizar a coleta”, explica Kauana. Os exames de imagem são todos feitos em Palmeira, assim como os de gravidez.
Mulheres chegando na Estratégia Saúde da Família em Queimadas
Andréa Baggio precisou de consulta na Unidade de Saúde de Queimadas, no começo de 2020, para sua filha Ana Flávia, que apresentava uma mastite no seio. Andréa contou que a médica deu um remédio para a filha, mas não resolveu o problema. Em janeiro deste ano, a menina teve outro problema de saúde e precisou do atendimento da Unidade. Como sua filha estava com dor, Andréa não foi trabalhar no período da tarde e a levou para consultar, mas não foi atendida. A UBS alegou que naquele dia só era possível atender pessoas que já estavam agendadas. “Assim mesmo a enfermeira deu uma olhada nela e pediu para vir no outro dia cedo, só deu um paracetamol e um ibuprofeno para ela tomar. Mas ela estava com muita dor e ai, dali mesmo, eu levei para um médico particular em Palmeira”, relata Andréa. Em Palmeira, a filha de Andréa conseguiu fazer os exames necessários.
Para ela, é importante que a comunidade tenha uma UBS e que o atendimento seja bom para aqueles que precisam de um acompanhamento, mas segundo a moradora, o serviço falha quando é para atender casos que chegam sem hora marcada ou sem ficha. “Minha sogra uma vez estava ruim e foi até lá para consultar, mas não tinha ficha porque você tem que ir só de manhã e ficar lá esperando. Se vai depois do almoço só atendem os agendados, às vezes passa mais de ano sem você ir lá, mas quando precisa não é atendido”, relata.
Andreia do Nascimento, que é moradora de Vileiros, mas utiliza a UBS de Queimadas, também relata que o principal problema da saúde na comunidade é a demora no atendimento. “A gente tem que ir de madrugada pra conseguir uma ficha e só são atendidos dez pacientes por dia, quando falta médico aqui tem que ir em uma unidade mais próxima”. Outra questão levantada por Andreia é sobre os problemas causados pelo plantio de fumo, pois entende que é o que mais prejudica a mulher física e psicologicamente. Para ela, mesmo o fumo estando muito presente na cultura do campo, traz muitos malefícios às mulheres, como intoxicação por tabaco, tremores, tontura, dor de cabeça, náusea, cólicas, dores musculares, insônia, depressão, ansiedade e suicídio.
Boletim Covid-19 – informação contra a pandemia – uma produção do curso de Jornalismo da UEPG.
Reportagem: Amanda Martins e Kathleen Schenberger Edição: Daniela Valenga Professores responsáveis: Karina Woitowicz e Rafael Kondlatsch
Produção jornalística de extensão realizada à distância e inteiramente online, em respeito às normas de segurança e isolamento social.
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O primeiro contato de Juliana Lazzarotto Freitas com a pesquisa foi na graduação em Gestão da Informação, na Universidade Federal do Paraná, quando participou da Iniciação Científica. “Sempre gostei de me aprofundar nas pesquisas científicas desenvolvidas na área, para buscar soluções às questões relativas à mensuração, organização e análise da informação científica”, relata. Juliana também adiciona como motivações para seguir na pesquisa a visão da ciência como mecanismo de transformação social e o efeito, direto ou indiretamente, de contribuir com a melhoria da qualidade de vida. “Ainda assim, é uma realidade muitas vezes desmotivante, devido à instabilidade na manutenção de projetos e bolsas e às limitações de atuação como pesquisadora, devido à escassez de oportunidades permanentes em institutos de pesquisa que não sejam instituições de ensino superior”, desabafa. Atualmente, Juliana é bolsista do Programa de Capacitação Institucional do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), uma unidade de pesquisa pública vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). “O INMA é carente de recursos humanos permanentes, ou seja, de servidores que sejam especialmente pesquisadores. Quem desenvolve a pesquisa científica no instituto são prioritariamente os pesquisadores bolsistas, com contratos temporários, sendo a maioria deles altamente qualificada”, explica.
Entre 2015 e 2021, o orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações teve uma redução de 58%. Neste ano, o valor será de 2 bilhões e 735 milhões, enquanto que em 2015, o orçamento do Ministério era de 6 bilhões e 555 milhões. O Elos conversou com os pesquisadores Juliana Lazzarotto Freitas, do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA), e Fábio Mascarenhas e Silva, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) sobre o histórico e contexto atual da Ciência, Tecnologia e Inovações (CT&I) no Brasil. Os pesquisadores explicam que os investimentos em CT&I atingem diferentes perfis da sociedade. “Eles geram produção de conhecimento científico, oportunidades de emprego, mão de obra qualificada, bens e serviços de maior valor agregado, que são fatores cruciais para o desenvolvimento de um país no modelo econômico predominante”, explicam.
No gráfico é possível notar a queda no orçamento total do MCTI e em outros três setores adjuntos. O orçamento destinado ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) caiu cerca de 17% nos últimos seis anos. Criado em 1969, é responsável pelo financiamento do desenvolvimento e inovação científico e tecnológico. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), por sua vez, teve a menor variação: R$ 1.398.405.189 (2015) e R$ 510.080.208 (2021). É também responsável pela distribuição de bolsas de pesquisa pelo país. Já o Plano Anual De Contratações (PAC) voltou a ter orçamento em 2016, recebendo R$ 2.242.718.239, mas tendo quedas consecutivas até seu último orçamento em 2019, de R$ 288.330.962.
Para Juliana e Fábio, os efeitos dos cortes de investimento em pesquisa vão ser sentidos a curto, médio e longo prazo. Os efeitos mais sensíveis poderão ser observados por indicadores mais imediatos, dentro de um ou dois anos, como a quantidade publicações científicas, de bolsas destinadas à pesquisa em diferentes modalidades e graus acadêmicos e a quantidade de pessoas que ingressam em programas de pós-graduação em instituições de ensino superior. “Outras repercussões serão mais bem identificadas a médio e longo prazo, talvez em um horizonte de cinco anos, ainda não temos como afirmar com exatidão quais serão e qual a dimensão do prejuízo”, expõem. Juliana e Fábio indicam como possíveis consequências a redução de depósitos de patentes, menor investimento em recursos humanos permanentes de pesquisa e redução de indicadores de colaboração científica. Como consequência, pode haver redução da participação brasileira e até mesmo a perda do protagonismo internacional em alguns ramos da ciência. “Tais situações são possíveis em razão da descontinuidade de projetos precedentes e de projetos atuais carentes da linearidade e estabilidade de uma política de governo”, justificam.
Histórico
Juliana e Fábio relatam que alguns dos institutos públicos de pesquisa brasileiros foram criados já na época do Império, como o Observatório Nacional. No final do século XIX e no início do século XX, a partir de demandas e interesses pontuais para atender às questões de pesquisa e de saúde pública surgiram, por exemplo, Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) que, atualmente, é vinculada ao Ministério da Saúde e considerada a mais destacada instituição de ciência e tecnologia em saúde da América Latina.
As políticas públicas de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) emergiram no cenário pós 2ª Guerra Mundial, no Brasil, tendo a produção e acesso à informação como um dos insumos primordiais para gerar bens e serviços. “Neste cenário, houve um estímulo internacional, especialmente liderado pela Organização das Nações Unidas (ONU), para a criação de instituições, sistemas e políticas nacionais de informação científica e tecnológica em diversos países em desenvolvimento, incluindo o Brasil”, explicam. Por conta disso, o desenvolvimento de políticas públicas de CT&I buscavam fortalecer os planos do governo, atrelado às políticas de estado.
Os pesquisadores descrevem que as décadas de 1950 a 1970 marcaram o período de criação dos principais organismos incumbidos da formulação das políticas públicas no Brasil e pelo início da reorganização das atividades de ciência no país. Em 1951, por exemplo, foram criados o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que tem o objetivo de promover a pesquisa científica e tecnológica por sua própria iniciativa e em cooperação com outras instituições do país e do exterior, e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes), com o objetivo de assegurar o aperfeiçoamento de pessoal de nível superior no país, garantindo assim, a existência de técnicos e cientistas que possam atender a demanda nacional. Ambos, CNPq e Capes complementam-se, um ao outro. “O vínculo da pesquisa científica com a educação foi estabelecido a partir da Lei de criação do CNPq, que determinava que o mesmo deveria cooperar com instituições de ensino superior a fim de desenvolver a pesquisa e preparar pesquisadores”, explica Fábio.
Em 1954, surge o Instituto Brasileiro de Biblioteconomia e Documentação (IBBD), que foi transformado no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) em 1976. O IBICT tem o papel de promover o desenvolvimento de recursos e infraestrutura de informação em ciência e tecnologia para a produção, socialização e integração do conhecimento científico e tecnológico no país.
“Na década de 1990 se estabeleceu a ideia da denominada ‘sociedade da informação’, cujas motivações tiveram forte viés econômico e industrial”, lembra Juliana. Ela e Fábio explicam que o processo de desenvolvimento científico e tecnológico no Brasil priorizou a consolidação de uma infraestrutura voltada à prestação de serviços e à indústria, tendo a pesquisa e inovação como resultados. A partir da década de 2000, iniciativas e recursos direcionados à pesquisa contribuíram para o progresso da CT&I no país. “Além disso, o acesso aberto à produção científica foi facilitado com iniciativas que visavam promover maior visibilidade à ciência produzida no país”, completa Fábio. Um exemplo deste processo é a criação da Scientific Eletronic Library Online (SciELO), resultado da parceria entre a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e o Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (Bireme).
Também fazem parte da história de investimento em CT&I no Brasil as Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPS’S). No Paraná, a Fundação Araucária foi fundada em 2000. “Todas essas instituições viabilizam recursos para o desenvolvimento da pesquisa nas diversas áreas do conhecimento, exercendo papel significativo, tanto para as definições, quanto para a execução da política científica tecnológica nacional”, explicam os pesquisadores.
Manifestação contra o sucateamento da educação, ciência e cultura no Centro de Curitiba, em 2019. Foto: Arquivo Lente Quente/David Candido.
Na década de 2010, os pesquisadores recordam as ações voltadas à inovação e investimento na ciência. “O Brasil se destacou no cenário internacional da produção científica e ampliou a formação de pesquisadores em diferentes áreas”, recordam. Na atualidade, os dois avaliam uma ausência de políticas públicas e de planos consistentes que possam promover o avanço da CT&I no país, a médio e longo prazo. “Em décadas passadas, independentemente de vieses ideológicos, muitas ações contribuíram para o fortalecimento da CT&I no país, como exemplo tivemos a criação da Embraer, Embrapa e Engesa, polos de produção de tecnologia de alto valor agregado, mesmo no período de regime militar”, expõem.
Para eles, atualmente, há uma fragmentação de ações que não se sustentam como política, pois não se percebe uma articulação entre os atores que compõem o quadro de ciência e tecnologia no país. “O cenário é de crise e retrocesso nos mais diversos setores, que carecem de políticas públicas consistentes que possam endossar investimentos mantenedores das atividades de CT&I no país. Vivemos a desvalorização da pós-graduação e a instabilidade na manutenção de projetos devido à inexistência de políticas e de um projeto de governo”, concluem.
Boletim Covid-19 – informação contra a pandemia – uma produção do curso de Jornalismo da UEPG.
Reportagem: Heryvelton Martins Edição: Maria Eduarda Eurich Professores responsáveis: Paula Rocha e Rafael Kondlatsch
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