Crimes, penas e torturas: a lei da anistia em perspectiva crítica

Heloísa Fernandes Câmara e Pedro Miranda abordam os abusos que aconteceram na ditadura militar e os golpes contra a democracia na atualidade

 

Heloísa Fernandes Câmara foi uma das participantes do VI Ciclo Descomemorar Golpes// Foto por: Maria Gallinea

 

Os traumas e as consequências da ditadura militar no Brasil, cujos ecos ainda reverberam nas estruturas sociais e políticas do país, foram tema de uma análise crítica sobre os crimes, penas e torturas perpetrados durante o regime. As repercussões atravessam décadas, chegando até os dias atuais, quando se debate no país um projeto de anistia aos golpistas envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023 que resultaram na depredação da Praça dos Três Poderes. A relação entre passado e presente foi pautada no VI Ciclo Descomemorar Golpes, evento promovido pelo projeto Combate à Desinformação da UEPG no início de abril.

A palestra foi conduzida pela professora Heloísa Fernandes Câmara, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e pelo professor Pedro Miranda, da UEPG, com a mediação do presidente da Seção Sindical dos Docentes da UEPG (Sinduepg), Volney Campos dos Santos. O evento, de natureza acadêmica e ao mesmo tempo engajada com as questões políticas contemporâneas, buscou estabelecer uma ponte entre o passado traumático da ditadura militar e as tensões políticas atuais, refletindo sobre a importância da memória histórica para a construção de um futuro mais democrático.

A professora Heloísa trouxe um olhar fundamentado sobre o conceito de anistia, um tema que, devido aos recentes eventos de 8 de janeiro em Brasília, tem ganhado relevância no debate público. A professora não apenas explicou o significado original da anistia, mas também contextualizou sua implementação após a ditadura militar como uma tentativa de pacificar o país após anos de repressão.

Contudo, ela alertou sobre os riscos de uma releitura conveniente da história, em que o pedido de anistia, hoje, pode ser distorcido para suavizar ou até mesmo apagar os crimes cometidos durante o regime militar. Heloísa, de forma contundente, afirmou: “40 anos após a redemocratização, estamos vivendo um processo onde pedem por anistia”, destacando a atual onda de revisionismo e a crescente tentativa de legitimar atitudes autoritárias. Sua fala levantou um questionamento importante: até que ponto a sociedade brasileira está disposta a permitir que as lições do passado sejam esquecidas ou manipuladas para justificar ações que caminham na direção do autoritarismo?

Em seguida, o professor Pedro Miranda adotou uma abordagem diferente para aprofundar a discussão. Miranda destacou como as dinâmicas de repressão, controle e censura que marcaram o regime militar parecem ganhar novas formas nos dias atuais, seja por meio de discursos de ódio, censura à imprensa ou ataques à democracia. Através de uma análise comparativa, ele fez uma conexão crítica entre as estratégias de manipulação da opinião pública durante a ditadura e as táticas utilizadas por certos grupos políticos hoje, que buscam enfraquecer as instituições democráticas e garantir uma maior concentração de poder. Esse olhar para o presente, ancorado na memória do passado, provocou uma reflexão coletiva sobre a repetição de padrões autoritários.

As palestras indicaram que, apesar dos avanços conquistados desde a redemocratização, o país ainda está longe de alcançar uma plena reconciliação com o passado. O Brasil vive um momento de extrema polarização política, em que os ataques às instituições democráticas e aos direitos civis são recorrentes. O evento reafirmou a importância de manter viva a memória das vítimas da ditadura militar e de lutar contra qualquer forma de revisionismo que busque minimizar ou justificar os horrores daquele período.

No fim, o evento alertou os presentes sobre a necessidade de vigilância constante, pois o processo de consolidação da democracia no Brasil é frágil e exige um compromisso contínuo da sociedade para garantir que as conquistas sejam preservadas. “Olhar o passado, pensar o presente e construir o futuro” foi, assim, mais do que uma reflexão acadêmica: foi um apelo para que todos os cidadãos brasileiros se comprometam ativamente com a defesa da democracia e dos direitos humanos, sem jamais permitir que o país retroceda na luta contra a opressão e a repressão.

 

Texto por Bebel Costalonga e Maria Gallinea

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