Jornalistas mulheres se unem e denunciam assédios e violações

No último domingo (1º de abril) a Assessora de Comunicação do Operário Ferroviário Sport Clube, Bianca Ivone Machado, de Ponta Grossa, Paraná, foi assediada verbalmente em Irati, também no Paraná, no estádio Emílio Gomes, enquanto exercia seu trabalho. O caso aconteceu no fim da partida após o time do Operário ganhar do Iraty. Cerca de 20 torcedores do Iraty Sport Club, entre homens e mulheres, atacaram Bianca verbalmente inúmeras vezes. A tentativa de um fotógrafo que estava presente de defender Bianca fez com que a torcida hostilizasse a jornalista mais ainda.

 Na terça-feira (dia 3 de abril) Bianca foi até a delegacia e realizou um Boletim de Ocorrência. A assessora filmou com seu celular o que estava acontecendo, mesmo assim a torcida não se intimidou e continuou hostilizando e ofendendo a mesma. Em nota, em uma de suas redes sociais, Bianca afirmou : “Durante os jogos, costumo ficar de fones de ouvido escutando alguma rádio que esteja transmitindo o jogo. Desde que comecei a trabalhar com isso, os fones também têm sido uma alternativa para não ouvir as ofensas quando passo em frente à torcida adversária”, mostrando a gravidade da situação, que não á algo novo.

Duas semanas antes, a repórter Renata Medeiros, da Rádio Gaúcha, foi insultada e agredida fisicamente por um torcedor enquanto cobria o jogo do Grêmio contra o Internacional. O torcedor disse “Sai daqui, sua puta” para a jornalista.  Na mesma semana, em cobertura ao vivo da partida do Vasco contra Universidad do Chile, pela libertadores, Bruna Dealtry, repórter do canal Esporte Interativo, durante uma entrevista com os torcedores foi beijada, à força por um torcedor.  Bruna ficou constrangida, disse que a atitude “não foi legal”, e continuou a transmissão.

A jornalista Aline Leonardo, de Francisco Beltrão no Paraná, trabalha com esporte na cidade e é a única mulher no meio de 17 colegas de profissão. Aline considera deprimente a falta de respeito com as mulheres que estão apenas realizando seu trabalho.  “Aconteceu comigo principalmente no início (estou entrando na terceira temporada), de ouvintes mandarem recados falando coisas que não tinham nada a ver com o meu trabalho. Eram elogios, mas desnecessários naquele momento, fugia de todo o contexto, então eu ficava extremamente constrangida e nervosa. No ginásio, pediam pra tirar fotos, ficavam mandando beijo. Ano passado, em um jogo da LNF (Liga Nacional de Futsal), eu estava indo para a cabine e um homem me pegou pelo braço para dizer que ouviria a nossa transmissão. É desafiador enfrentar tudo isso, é o principal motivo que me faz relutar em ser repórter de quadra”, concluiu Aline.

                Marcilei Rossi, jornalista que atualmente trabalha em Pato Branco, Paraná, quando questionada sobre a dificuldade que uma mulher encontra nas redações de jornais afirma: “Não costumo “deixar barato”, pois acredito que o potencial e a qualidade de trabalho de um profissional não se medem por ser homem ou mulher”.  Marcilei também conta que, em mais de nove anos se dedicando exclusivamente ao jornalismo, já se deparou com diversas situações indesejadas, incluindo na área política e esportiva. Nos estádios ela já escutou que não deveria estar lá, por ser mulher, e rebateu “Não é porque sou mulher que não entendo de esportes”.

                Beatriz Lima de Castro, jornalista em Curitiba, acredita que o preconceito e a falta de respeito com mulheres que estão trabalhando vêm de uma falta de conscientização, principalmente com mulheres que trabalham no meio esportivo, que é considerado “lugar de homem, não de mulher”. Ela diz que os casos de desrespeito acontecem nos grandes estádios, mas principalmente nos jogos da suburbana, onde se tem pouca segurança e controle sobre as torcidas, dando espaço para que o preconceito e o assédio se façam presentes. “Muitos torcedores, pelo o que eu percebo, eles partem do pressuposto que a gente está no estádio, à gente não está onde deveria estar, que aquele não é um lugar apropriado para uma mulher. Então, para eles, nós temos que aceitar e arcar com as consequências do que vamos escutar, dos gestos que nós vemos”.

                Em meio a tantos casos graves de assédio foi criada a hashtag “#DeixaElaTrabalhar” por um grupo de 52 jornalistas que trabalham com esporte, entre elas, apresentadoras, repórteres e assessoras de vários veículos e emissoras. Segundo as jornalistas, que se colocam como representantes de todas as mulheres que atuam na mídia esportiva, o objetivo da manifestação é lutar conta o assédio sexual e moral sofrido por todas nos estádios, nas redações e nas ruas. O grupo exige punição contra assediadores, além de mais respeito ao seu trabalho e até melhorias estruturais, pois há estádios no Brasil em que não há banheiros femininos, mostrando o ambiente machista em que as jornalistas se submetem. A repercussão da hashtag foi mundial, jornais como BBC e The Guardian, da Inglaterra, L’Equipe, da França, e Deutsche Welle, da Alemanha, publicaram sobre a iniciativa

Aline Leonardo afirma que se sente representada pela hashtag: “Nossas realidades são tão diferentes, mas os problemas são os mesmos. Isso só reforça que precisamos seguir e precisamos estar juntas, mesmo que seja através desses movimentos, pra saber que não estamos sozinhas na briga” afirma Aline.

                “ Nosso pedido é simples. É de uma forma que não agride a ninguém e batemos na mesma tecla de gigantes empresas de comunicação do Brasil: #DeixaElaTrabalhar.”

 

Por Milena Oliveira

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