Mesmo a universidade sendo um espaço para todos ainda existem preconceitos
A lei de cotas de n° 12.711 foi sancionada no Brasil em 2012 e garante uma reserva de 50% das matrículas por curso e turnos. As vagas por cotas são subdivididas entre estudantes de escolas públicas, cotas raciais, cotas para candidatos com deficiência (PCD) e cotas para candidatos indígenas e quilombolas.
Neste ano de 2024 os dados do Censo da Educação Superior apontam que, em 2023, 51% dos alunos cotistas concluíram o curso, enquanto a conclusão entre não cotistas foi de 41%. Mesmo com maior desempenho, alunos cotistas ainda sofrem preconceito dentro da universidade.
Na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) as vagas tanto do Vestibular como no Processo Seletivo Seriado (PSS) são distribuídas em 5% para candidatos com deficiência, independente do percurso de formação escolar. 5% para candidatos que se autodeclaram negros, independente do percurso de formação escolar. 10% para candidatos se autodeclarem negros oriundos de Instituições Públicas de Ensino. 40% aos candidatos oriundos de Instituições Públicas de Ensino e de até 40% destinadas a concorrência universal.
A estudante do primeiro ano de direito na Universidade Estadual de Ponta Grossa, Natalia Dolgan, desabafa que algumas vezes já sentiu um ar de superioridade vindo de alguns colegas. “É como se eu fosse inferior a eles só porque entrei por cota de escola pública, como se eles fossem melhor do que eu”. Natália também conta que sair de uma escola pública e ir para uma Universidade Estadual é se deparar com uma rotina muito mais pesada, “ A cobrança na escola pública é muito menor do que na Universidade, se acostumar com essa nova rotina é um dos problemas que alunos cotistas enfrentam”. Outra dificuldade relatada pela jovem é a comparação com colegas de turma em questão de materiais de estudo e futuro na profissão, “Muitos dos meus colegas vêm de família de advogados, o que faz eu questionar o meu lugar no curso. Fora os materiais de estudos, que a cada semana é um novo livro que tem um valor de custo”.
A acadêmica Alice Bem, estudante do primeiro ano de Comercio Exterior na Universidade Estadual de Ponta Grossa, cotista de escola pública, relata dificuldade em relacionar matérias com o trabalho para conseguir se manter na Universidade. “Algumas das minhas atividades do curso precisam ser elaboradas no período em que estou trabalhando. Eu preciso escolher entre ir mal em uma matéria ou trabalhar para me manter em Ponta Grossa”, desabafa. A estudante é da cidade de Irati e mora em Ponta Grossa para estudar.
As políticas de cotas integram as ações afirmativas, que são instrumentos políticos para reparar e combater discriminações históricas etnico-raciais, de gênero e de classe no acesso à educação, à política e à saúde, por exemplo. A assessora de pedagogia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) Daniele Martins comentou sobre a necessidade de existirem as cotas dentro da universidade. “Além de abrir portas, as cotas ampliam a visibilidade, o que ajuda a desmistificar preconceitos e ajudam a reduzir as desigualdades socioeconômicas, permitindo que pessoas tenham mais oportunidades de crescimento e participação na sociedade”. A assessora pedagógica destaca que mesmo com o preconceito sofrido pelos os acadêmicos cotistas é necessária a existência das cotas para que haja mais diversidade dentro das universidades, já que a universidade é para todos.
Para acadêmicos cotistas e vestibulandos que pretendem entrar na universidade através de cotas acesse o link para entender melhor sobre a lei de cotas sancionada no ano de 2012 e reformulada pelo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2023.
A cientista Nina da Hora alerta a necessidade de justiça algorítmica em sistemas de IA
Nesta quarta-feira (13), aconteceu a primeira palestra que compõe o projeto Rede de Formação em Cultura Digital – LABIC Curitiba. A palestra “Racismo algorítmico” foi ministrada pela cientista da computação, Nina da Hora, que abordou como os algoritmos podem reproduzir e reforçar preconceitos e desigualdades.
Os algoritmos são um conjunto de instruções específicas e organizadas que são seguidas sequencialmente para solucionar problemas ou executar atividades. Nas redes sociais, esses algoritmos funcionam como sistemas de recomendação que utilizam Inteligência Artificial (IA). A partir disso conseguem decidir quais conteúdos e páginas são exibidos em destaque na linha do tempo dos usuários.
Atualmente, a Inteligência Artificial está cada vez mais presente no cotidiano, deste modo, impacta diretamente a vida das pessoas. De acordo com Nina, quando os algoritmos recebem o poder de decidir, a partir dos critérios de seus criadores, os potenciais discriminatórios se multiplicam e passam a impactar negativamente minorias raciais em torno do mundo.
A cientista explica que o algoritmo não tem transparência e é treinado com um conjunto de dados com rumos e intenções desconhecidas. “Parece que a máquina está “pensando” mas há mãos humanas por trás de todo o processo”. Segundo ela, os sistemas de IA, especialmente os que envolvem aprendizado profundo (deep learning) são opacos e difíceis de explicar.
“Como nós, pesquisadores, vamos explicar para o público negro que eles podem confiar nesses sistemas autônomos se nós não conseguimos entender como funciona”, questiona.
Ao se aprofundar no tema, Nina também investiga o racismo algorítmico no reconhecimento facial. Para ela, o reconhecimento facial foi construído com influência eugenista, por isso, cientistas da computação precisam se preocupar com os aspectos sociais de suas criações, dado que isso não é um erro computacional, mas um problema que precisa ser debatido na computação. “Precisamos pensar na justiça algorítmica (sistemas justos que respeitem a diversidade social e cultural) para entender e mitigar os vieses, assim evitar a reprodução de desigualdades sociais”, defende.
O evento Rede de Formação em Cultura Digital – LABIC Curitiba, ocorre dos dias 13 a 16 de novembro e desenvolve debates, oficinas e palestras sobre os impactos da tecnologia e inspira ações que tornem os sistemas digitais mais inclusivos e justos.
Direitos das profissionais do sexo e analfabetismo emocional são temas de peças do festival
Anteriormente jurada e debatedora do festival, Guta Stresser
retorna como atriz. Foto: Victor Schinato
A 52° edição do Festival Nacional de Teatro (Fenata) iniciou no dia 7. A programação principal conta com 37 espetáculos, com companhias de teatro do Brasil todo e artistas que, em sua subjetividade, muitas vezes tratam de temas que tocam nos direitos humanos.
O Fenata é organizado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) em parceria com a Fundação de Apoio a UEPG (FAUEPG) e possui apoio de órgãos públicos como as secretarias municipais de Turismo e Cultura, o Ministério da Cultura e é também participante da Lei de Incentivo à Cultura (Lei Rouanet).
No segundo dia do evento, 8 de novembro, foram apresentadas no Cine-Teatro Ópera as peças “Meretrizes”, do Coletivo Gompa de Porto Alegre-RS; e “Os Analfabetos”, da Cia À Curitibana Portátil, de Curitiba. Além disso, também foram performadas “Mortes Ardentes, Paixões Enterradas” e “Iepe”, na Estação Saudade e no Auditório da UEPG Central.
As artistas cedem o espaço no palco para que as mulheres entrevistadas
possam responder perguntas. Foto: Victor Schinato
“Meretrizes”: um documentário ao vivo sobre a prostituição no Brasil
O espetáculo “Meretrizes”, do Coletivo Gompa de Porto Alegre, é uma coletânea de relatos, entrevistas, filmagens e encenações que remontam às experiências coletivas de prostitutas no país. Liane Venturella assume o papel de uma cafetina que, no palco trajado de casa de shows, performa um documentário ao vivo juntamente com Catarina Domenici no piano.
Liane inicia a peça contando sua história de vida, que segundo ela, pouco importa se é verdade ou não. Na fala da artista, ela retoma o passado quando foi para Londres e não tinha renda suficiente para pagar curso de atuação e de inglês ao mesmo tempo, situação que motivou Liane a ingressar na prostituição. História semelhante aconteceu com Catarina. Como mencionado pelas artistas, a veracidade é insignificante, porque a história aconteceu repetidas vezes, com mulheres o suficiente, para que tenha se tornado uma suposta verdade.
A partir da projeção de vídeos gravados pela produção do Coletivo Gompa, profissionais do sexo podem expor suas verdades e vivências, sem romantizações ou demonizações, como aponta Liane. Para as mulheres que escolheram não se identificar, foram criadas linhas de texto que, através da encenação e música, podem exemplificar as vivências gerais de todas aquelas que trabalham com sexo.
Ao final do espetáculo, o teatro se mescla a uma palestra e mulheres que participaram dos vídeos podem responder a dúvidas do público, sejam elas sobre o roteiro, produção ou a vida das mulheres que trabalham com sexo.
Jane Felipe Beltrão e Andrea Ferreira Bispo, pesquisadoras sobre o direito de trabalhadoras sexuais, em um ensaio para a revista Saúde em Debate, afirmam que atualmente existem três reações possíveis ao trabalho sexual: o proibicionismo; o abolicionismo; e a regulamentarismo. Países como Tailândia e Irã assumem uma postura proibicionista, com pena monetária ou física em casos de infração. O Brasil se enquadra como abolicionista, na ótica de que prostitutas ocupam um local de vítima, não proibindo o exercício da profissão, mas cerceando ações que colaborem para a prostituição. A regulamentação presume a criação de políticas públicas que protejam os direitos constitucionais e a segurança de profissionais do sexo.
De um ponto de vista penal, o trabalho sexual não é crime. É crime apenas ter uma casa de prostituição, induzir uma pessoa a se prostituir ou viver às custas da prostituição de outra pessoa. Todos esses crimes buscam, em última instância, proteger os profissionais do sexo contra abusos de terceiros.
Desde 2002, o Ministério do Trabalho reconhece o trabalho sexual como ocupação. É o código 5198 da Classificação Brasileira de Ocupações, intitulada “profissionais do sexo”. No entanto, vale lembrar que esses profissionais não dispõem de nenhum direito trabalhista ou previdenciário, porque não há uma lei que regulamente a profissão.
A construção da peça conta com apenas lanternas seguradas pelos atores
e luz negra. Foto: Victor Schinato
“Os Analfabetos”: Espetáculo aborda a incomunicabilidade e os direitos humanos relacionados à expressão emocional
A peça “Os Analfabetos”, dirigida por Adriano Petermann e escrita por Paula Goja, é um drama psicológico que se propõe a explorar temas relevantes aos direitos humanos, como o respeito mútuo à subjetividade de outros indivíduos.
A história gira em torno de seis personagens que, apesar de diferentes entre si, compartilham um desafio comum: a luta para equilibrar a necessidade de adequação social com o desejo de expressar emoções genuínas. Inspirado pela obra do cineasta sueco Ingmar Bergman, o texto utiliza referências diretas e indiretas à incomunicabilidade emocional e ao isolamento interno que muitas vezes define as relações interpessoais. Elementos das obras da escritora francesa Virginie Despentes e do dramaturgo brasileiro Nelson Rodrigues são incorporados, criando uma narrativa que aborda a complexidade emocional dos personagens de maneira crua e honesta.
“Os Analfabetos” expõe a incomunicabilidade como uma barreira invisível, mas real, que impede os indivíduos de se entenderem plenamente e de serem compreendidos em sua totalidade. Os personagens se veem obrigados a usar “máscaras” para desempenhar papéis sociais, uma prática que, conforme ilustrado no espetáculo, pode levar a um distanciamento da própria identidade e a um aumento do sofrimento psíquico. Esse aspecto dialoga diretamente com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que assegura a liberdade de pensamento e expressão.
Em muitos aspectos, “Os Analfabetos” defende a ideia de que as pessoas têm o direito de ser autênticas e de expressar suas vulnerabilidades, sem medo de julgamento ou represálias. No contexto da peça, esse direito é frequentemente negligenciado pela sociedade, que exige de cada pessoa uma atuação específica e controlada. A criação de um ambiente seguro onde esses sentimentos podem ser externalizados é fundamental para o fortalecimento das relações humanas e para o reconhecimento da diversidade emocional de cada indivíduo. Os personagens de “Os Analfabetos” questionam esse paradigma ao explorar suas próprias limitações e carências, levantando a questão: até que ponto somos capazes de enxergar o outro além da máscara social?
Ao focar no analfabetismo sentimental, “Os Analfabetos” lembra o público de que a empatia é uma habilidade essencial para o fortalecimento das relações humanas e para a construção de uma sociedade inclusiva.
Mariana, personagem de Guta Stresser, é a peça central da trama.
Foto: Victor Schinato
Por Julio Maroneze, Maria Gallinea e Victor Schinato
A iniciativa promove oficinas sobre diversidade, sustentabilidade e combate à desinformação
Foto: Divulgação
O projeto Elos – Jornalismo, Direitos Humanos e Formação Cidadã, foi selecionado para participar do programa Redes de Formação em Cultura Digital – Labic Curitiba. Entre os dias 13 a 16 de novembro a iniciativa realizará oficinas voltadas para o desenvolvimento e construção de redes em Cultura Digital. Os temas abordados serão diversidade, formação, sustentabilidade, ações culturais, culturas indígenas, meio-ambiente, usos da inteligência artificial para o bem comum, livros e leituras. Também serão discutidos tópicos como combate à desinformação, educação midiática, tecnologias para o bem comum e ações de mídia.
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Em um país marcado pela desigualdade de renda e disparidades regionais, o incentivo à leitura enfrenta barreiras que vão desde a falta de bibliotecas até o alto custo dos livros
Em um país marcado pela desigualdade de renda e pela disparidade regional, o incentivo à leitura enfrenta barreiras que vão desde a falta de bibliotecas até o alto custo dos livros. Contudo, iniciativas comunitárias e avanços na tecnologia têm sido alternativas importantes para melhorar esse cenário. A seguir, vamos explorar os principais desafios, os dados mais recentes e as iniciativas que buscam transformar o acesso à leitura no Brasil.
O panorama atual da leitura no Brasil
A última Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro em parceria com o Itaú Cultural e publicada em 2019, revela dados preocupantes sobre os hábitos de leitura dos brasileiros. Segundo o estudo, cerca de 44% da população não lê livros e 30% nunca compraram um livro. A média de leitura por pessoa no Brasil é de apenas 2,5 livros por ano (considerando leitura completa), enquanto em países como França e Japão, essa média chega a 10 livros anuais.
Essa realidade é influenciada por uma série de fatores, entre eles o baixo índice de alfabetização funcional. De acordo com o Indicador de Alfabetismo Funcional (INAF), 29% dos brasileiros com idade entre 15 e 64 anos são considerados analfabetos funcionais, ou seja, têm dificuldades em interpretar textos mais complexos. Essa carência de habilidades de leitura e interpretação compromete o interesse pela leitura e o desempenho escolar, criando um ciclo vicioso que afasta cada vez mais a população dos livros.
Desigualdades regionais e econômicas
As desigualdades regionais têm um papel central na dificuldade de acesso à leitura. Regiões mais ricas, como o Sudeste, concentram o maior número de bibliotecas, livrarias e eventos literários, enquanto o Norte e o Nordeste enfrentam uma escassez de infraestruturas de incentivo à leitura. Ainda segundo dados do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP), mais de 30% dos municípios brasileiros não possuem uma biblioteca pública. Isso é especialmente grave em localidades pequenas e remotas, onde a população muitas vezes depende exclusivamente desses espaços para acessar livros.
Além disso, o preço dos livros é um obstáculo para muitas famílias. De acordo com uma pesquisa de 2020 da Câmara Brasileira do Livro (CBL), o preço médio de um livro no Brasil gira em torno de R$ 40 a R$ 60, o que torna a aquisição de livros difícil para a população de baixa renda, especialmente em um contexto de crise econômica e alta inflação. Essa situação contrasta com a realidade de países como Argentina, onde políticas de incentivo à leitura permitem acesso mais barato a livros, e com países da Europa, onde há subsídios e incentivo à produção literária.
A importância das bibliotecas públicas e escolares
As bibliotecas públicas e escolares são fundamentais para garantir acesso gratuito à leitura, especialmente para jovens e crianças. No entanto, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) mostra que a cada dez escolas públicas no Brasil, quatro não possuem uma biblioteca ou sala de leitura. A Lei 12.244/2010, que estabeleceu o prazo até 2020 para que todas as instituições de ensino possuíssem uma biblioteca, ainda não foi plenamente implementada. A ausência desses espaços agrava a desigualdade no acesso à leitura e prejudica o desenvolvimento educacional dos alunos.
Para tentar mitigar essa realidade, algumas escolas e organizações têm investido em bibliotecas itinerantes e em projetos de incentivo à leitura. No Ceará, por exemplo, a Secretaria de Educação do Estado criou a iniciativa “Bibliotecas em Movimento”, que leva livros para escolas e comunidades em áreas de difícil acesso. Em São Paulo, projetos como o “BiblioSesc”, realizado pelo Serviço Social do Comércio (Sesc), utilizam caminhões adaptados para circular em regiões com poucas livrarias e bibliotecas.
O papel das iniciativas comunitárias
As iniciativas comunitárias têm sido um pilar fundamental para o acesso à leitura no Brasil. Projetos como o Leia para uma Criança, da Fundação Itaú Social, têm como objetivo distribuir livros gratuitos para crianças em idade pré-escolar, visando o desenvolvimento do hábito de leitura desde a infância. Segundo dados da própria fundação, o programa já distribuiu mais de 57 milhões de livros desde o seu lançamento em 2010, alcançando milhões de famílias em todo o país.
Outra iniciativa importante é o Projeto Literatura nas Praças, que disponibiliza acervos em praças públicas de diversas cidades e incentiva a troca de livros entre a população. Esse tipo de ação cria um ambiente de leitura em espaços acessíveis e inclusivos, beneficiando principalmente as pessoas que não têm condições de comprar livros ou frequentar bibliotecas.
A Roda de Leitura, desenvolvida em comunidades no Rio de Janeiro, também é um exemplo de sucesso: ao criar um espaço de compartilhamento de histórias, o projeto promove a literatura como um meio de expressão, oferecendo à população local a oportunidade de interagir com autores, contadores de histórias e educadores.
Tecnologias e o acesso digital como alternativa
Com o avanço da tecnologia, o acesso à leitura digital tem se mostrado uma alternativa viável e promissora, especialmente durante a pandemia de COVID-19, quando o fechamento de bibliotecas e livrarias físicas restringiu ainda mais o acesso aos livros. A popularização de aplicativos de leitura digital, como o Kindle que é pago, e plataformas de livros gratuitos, como o Domínio Público e a Biblioteca Digital Camões, oferecem milhares de obras gratuitamente para download.
Um exemplo é o BibliON, uma biblioteca digital pública lançada em 2021 pelo Governo do Estado de São Paulo. Com acervo de cerca de 15 mil títulos, a plataforma oferece livros gratuitamente e facilita o acesso para leitores de baixa renda. No entanto, o acesso à leitura digital ainda enfrenta barreiras, como a necessidade de dispositivos eletrônicos e uma conexão à internet de qualidade, algo que, segundo o IBGE, 37% dos domicílios brasileiros ainda não possuem.
A Bienal do Livro e o acesso à cultura literária
Eventos literários de grande porte, como a Bienal do Livro, ainda não conseguem alcançar todo o potencial de acessibilidade e inclusão social. Apesar de ser um dos maiores eventos literários da América Latina, com uma programação diversificada que inclui palestras, lançamentos e atividades culturais, o custo da entrada e a localização em centros urbanos limitam o acesso para uma parcela significativa da população. O autor independente Paulo Novais, que está em seu décimo terceiro livro, destaca que a Bienal “ainda não é um evento para toda a população, pois o custo de deslocamento e o preço dos ingressos são barreiras para pessoas que vivem nas periferias e em áreas mais distantes do centro”. Segundo ele, o evento precisa de políticas que ampliem o acesso para comunidades de baixa renda, promovendo mais atividades inclusivas e facilitando o transporte e a distribuição de ingressos gratuitos.
Desafios e caminhos para o futuro
O acesso à leitura no Brasil enfrenta um caminho árduo frente à falta de políticas públicas. Investimentos na formação de professores e mediadores de leitura são igualmente necessários, pois são eles que desempenham o papel de incentivar o interesse pela leitura em crianças e adolescentes. Segundo o Plano Nacional de Educação (PNE), o Brasil precisa aumentar a porcentagem de escolas com bibliotecas e capacitar profissionais para atuar nesses espaços, com vistas a promover uma educação de qualidade.
Iniciativas comunitárias, os avanços na tecnologia e a atuação de ONGs e fundações,por sua vez, têm sido importantes para tornar os livros mais acessíveis e criar uma cultura de leitura no país. Para que o Brasil se torne uma nação de leitores, é fundamental que todos os setores da sociedade trabalhem juntos, investindo em educação e promovendo o acesso à leitura como um direito essencial para a formação cidadã e o desenvolvimento social.
A jornada para o aumento da leitura no Brasil é longa, mas, com um esforço conjunto, é possível mudar esse panorama e criar uma sociedade mais informada, crítica e conectada com o poder das palavras.
No Brasil, o aborto é autorizado por lei desde 1940 em casos de gravidez decorrente de estupro e risco à vida da gestante, bastando para isso o consentimento dela ou de seu responsável legal. (Decreto-Lei nº 2.848, Art. 128).
Desde 2012, por entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), o aborto também é permitido em casos de anencefalia do feto – um tipo de má-formação congênita incompatível com a vida fora do útero e caracterizada pela ausência total ou parcial do encéfalo.
No estado do Paraná, apenas um hospital realiza o procedimento do aborto legal, o Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná.
De acordo com o estudo realizado pela acadêmica de Jornalismo, Rafaela Koloda, embora o aborto seja um direito garantido por lei, o assunto ainda não tem a visibilidade devida nos veículos de comunicação. A situação ainda se agrava nas regiões em que a onda de conservadorismo se faz fortemente presente.
Com a intenção de abordar como são feitas as coberturas que possuem como tema o aborto legal nos portais jornalístico da cidade de Ponta Grossa, a estudante da Universidade Estadual de Ponta Grossa, apresentou como Trabalho de Conclusão de Curso, a produção documental: “Verdades Veladas – Cobertura jornalística do aborto legal em Ponta Grossa”, na sexta-feira (01/11), sob a orientação da professora Paula Melani Rocha.
Entre as entrevistadas do documentário estava a pesquisadora, Carla Rizzotto, que criticou a cobertura jornalística no geral: “No Brasil a gente precisa falar mais sobre o aborto como um direito e não na posição de um tabu, como ele é tratado.”
O trabalho apurou notícias sobre aborto legal produzidas pelos veículos de comunicação de Ponta Grossa e constatou um número pequeno de registros, sendo que grande parte das notícias foram produzidas por agências de notícias e repassadas à imprensa da cidade, não sendo de contexto local.
O documentário também é marcado por acontecimentos políticos. O primeiro são os projetos de lei antiaborto propostos na Câmara dos Vereadores entre 2018 e 2023. Já o segundo é sobre o PL 1904/2024, que tramita na Câmara dos Deputados.
No documentário foram entrevistados os editores-chefes dos veículos Dcmais e aRede, além de uma advogada, uma ativista feminista, e jornalistas. Todos foram questionados sobre o enqadramento das notícias, os vazios nas coberturas e a pouca visibilidade da pauta aborto legal na cidade.
A estudante Rafaela relata que desde o início da graduação se interessou por pautas relacionadas aos direitos das mulheres e que durante o curso realizou diversos materiais e reportagens que diziam respeito a essa temática.
“Espero que a minha produção faça com que jornalistas e futuros profissionais reflitam sobre a falta de cobertura sobre um direito reprodutivo. Principalmente em uma cidade como Ponta Grossa, guiada por políticas conservadoras. O objetivo do documentário é realizar uma reflexão e fazer pensar novas formas de produzir notícias sobre aborto legal de forma ética, clara e sem utilizar o sensacionalismo”, declara Rafaela.
15,7% das cadeiras da câmara de vereadores serão ocupadas por mulheres
O segundo turno das eleições municipais de 2024 pela prefeitura foi marcado pela disputa entre duas mulheres, as mesmas que disputaram o segundo turno há quatro anos. Apesar disso, apenas três, das dezenove cadeiras da câmara de vereadores, serão ocupadas por mulheres. Teka dos animais (União) e Enfermeira Marisleidy (PMB) ocupam o cargo pela primeira vez. Enquanto Joce Canto (PP) foi reeleita e assumirá seu segundo mandato.
As mulheres representam 53% do eleitorado ponta-grossense, mas este índice não reflete na política do município. A socióloga e pesquisadora em política paranaense, Natalia Cristina Granato, explica que a desigualdade feminina na política brasileira possui fatores históricos, visto que só em 1932 as mulheres conquistaram o direito ao voto. “São variados os fatores que contribuem para o baixo número de mulheres na política, dentre os quais, a cultura machista que reserva às mulheres o espaço privado e doméstico, a falta de investimento nas candidaturas, além da violência política de gênero”.
A atuação das mulheres na política de Ponta Grossa teve início em 1951, quando Cândida Mendes Braz ocupou um lugar na Câmara Municipal. Após o seu mandato, somente 41 anos depois, nas eleições de 1992, obteve-se representação feminina novamente, com a vitória de duas mulheres. Este número se repetiu nas eleições legislativas municipais posteriores, até 2016, ocasião na qual apenas uma mulher se elegeu vereadora. Em 2020, três mulheres se elegeram, número que se manteve nas eleições deste ano. De acordo com Natalia, a falta de representatividade feminina na câmara reflete, também, na falta de políticas públicas para mulheres. “Muitos analistas apontam que o sistema político brasileiro é feito por homens e para homens, e isto reflete também na Câmara de Ponta Grossa”. A socióloga afirma que o olhar das mulheres faz a diferença na formulação de políticas públicas e combate às desigualdades e à violência contra a mulher.
A Lei no 9.504/1997 estabelece que “cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”, ou seja, cada partido precisa de no mínimo 30% de candidaturas do sexo feminino, porém a porcentagem de candidaturas não reflete a quantidade de mulheres eleitas.
As estudantes de jornalismo, Ester Roloff e Juliana Goltz, realizaram uma enquete anônima sobre a participação feminina na política na segunda-feira (28), após o segundo turno das eleições em Ponta Grossa para sondar como as eleitoras percebem a participação das mulheres na política local e a proposição de políticas públicas para mulheres. A enquete foi realizada em dois pontos na região central da cidade com grande circulação de pessoas, no calçadão e no terminal de ônibus, durante o período da tarde, e foram obtidas 31 respostas. A maioria das mulheres abordadas preferiu não participar da enquete.
Por Natalia Almeida, Pietra Gasparini e Amanda Grzebielucka
Médicos afirmam que exercício físico é essencial para o controle da doença
Talita foi premiada no Setembro em Dança 2024, evento realizado na cidade, com 1°lugar na categoria variação clássica de balé junior
Segundo a Federação Internacional de Diabetes, o Brasil ocupa o 6º lugar no mundo entre os países com mais pessoas com diabetes no geral e o 3º lugar quando se fala em diabetes tipo 1. Como os sintomas da doença podem demorar a se apresentar, cerca de 1 a cada 3 pessoas com diabetes não sabem ter a doença. Considerando essa informação, o número de diabetes no país pode ser ainda maior.
Entre os principais sintomas estão: muita sede, vista turva e emagrecimento. A universitária, Vivian Ferraz, descobriu aos 10 anos que possuía diabetes tipo 1. “Descobri em um espetáculo de balé onde passei muito mal, mas já tinha os sintomas fazia tempo”, lembra. Ela relata que muitas vezes a insulina sozinha não é tão eficaz. “A dança ajuda muito para a diabete, porque o exercício físico ajuda até mesmo a diminuir a aplicação de insulina, é como um outro remédio”, afirma.
Vivian conta que o principal problema que os diabéticos enfrentam ao fazer exercícios é a hipoglicemia (pouco açúcar no sangue, que pode levar a desmaios e, nos piores casos, ao coma). “É importante sempre estar atento aos sintomas e se alimentar antes do exercício”, aconselha. A universitária dança desde os cinco anos e ama o esporte. “É uma forma de lazer, a pessoa entende mais seu corpo e cuida mais da saúde, o exercício é um tratamento”, finaliza.
Com sete anos, Talita Oliveira Machado descobriu possuir diabetes tipo 1. “Minha glicemia em jejum estava 545, quando o normal é 100, então no dia seguinte já iniciei o tratamento”. Inicialmente, a estudante usou a caneta de insulina, com 8 a 10 aplicações por dia, mas hoje, aos 15 anos, usa a bomba de infusão de insulina. “É considerado o melhor tratamento, pois é o que chega mais próximo das funções do pâncreas”, explica. Atualmente, ela pratica balé e jazz, mas diz que se tivesse mais tempo faria outros tipos de dança, pois ama o esporte.
Talita confessa que a doença já atrapalhou ela durante as aulas de dança. “Se está muito alta (hiperglicemia) fico com muita sede e as vezes preciso correr para o banheiro no meio da aula, mas o exercício ajuda a baixar o açúcar no sangue”. A menina conta que seus médicos asseguram que diabetes não é uma doença, mas uma condição. “Você pode dançar o quanto quiser, fazer o esporte que quiser, apenas com a condição de ficar de olho em sua glicemia e prestar atenção aos sintomas”, declara.
Aproximadamente 20 milhões de brasileiros são diabéticos, é o que estima a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). “Uma de nossas metas é diminuir a diferença entre o tratamento oferecido nas redes de saúde pública e privada”, conta a médica e integrante da SBD, Bianca de Almeida Pititto. “No serviço público, embora já haja melhora, infelizmente há uma escassez de medicamentos gratuitos, que nem sempre são tão eficientes quanto os que são vendidos”, lamenta. A proposta que fizeram ao Ministério da Saúde é que o Sistema Único de Saúde (SUS) tenha os mesmos medicamentos que estão presentes na rede particular.
Qual a diferença entre diabetes tipo 1 e tipo 2?
A diabetes tipo 2 abrange a maioria dos diabéticos, cerca de 90%. Ela ocorre quando o organismo não consegue usar a insulina que produz ou não produz insulina, assim não consegue controlar a taxa glicêmica do corpo. Dependendo da gravidade pode ser controlada apenas com planejamento alimentar e atividade física, mas em casos mais graves pode ser necessário o uso de medicamentos. Se manifesta mais frequentemente em adultos, mas com o aumento de casos de obesidade em crianças e adolescentes, pessoas mais jovens estão sendo afetadas.
Já a diabetes tipo 1 aparece geralmente na infância e adolescência, mas pode ser diagnosticada em adultos também. Ela acontece em pessoas com predisposição genética, nas quais o sistema imunológico ataca equivocadamente as células do pâncreas que produzem insulina. Essa variedade é sempre tratada com medicamentos, planejamento alimentar e atividades físicas, para ajudar a controlar o nível de glicose no sangue.
Boneco e livro “Teodoro Adora” // Foto: Reprodução do instagram @teodoro_adora
A literatura infantil desempenha um papel fundamental no desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças. Além de estimular a imaginação e a criatividade, os livros voltados para o público infantil são importantes ferramentas educacionais que ajudam a construir valores e hábitos desde os primeiros anos de vida. Em uma era marcada pela digitalização, em que o tempo de tela é muitas vezes predominante, os livros se destacam como alternativas que oferecem, além de aprendizado, um momento de interação afetiva entre pais e filhos.
Durante a Bienal Internacional do Livro de São Paulo, a escritora e ilustradora de literatura infantil, Dorothy Rooma, trouxe à tona uma reflexão sobre o impacto de suas obras na relação entre adultos e crianças. A autora lançou duas coleções voltadas para o público infantil, destacando a importância dos livros como mediadores dessas relações.
“A coleção ‘Teodoro Adora’ tem dois eixos: hábitos saudáveis; e sociedade e cultura. Na parte de hábitos saudáveis, o Teodoro adora comer frutas, verduras, tomar sucos, escovar os dentes e muito mais. Já na coleção focada em sociedade e cultura, temos o Teodoro explorando o MASP (Museu de Arte de São Paulo) e as brincadeiras infantis de antigamente”, explicou Dorothy, ao falar sobre seus personagens e a missão por trás das histórias.
O conceito de seus livros vai além do simples entretenimento. A autora reforça que sua proposta tem um viés educativo voltado para a interação familiar, promovendo uma “materialidade para as relações parentais”. A ideia é criar momentos de troca entre adultos e crianças, usando a leitura como um elo que ajuda a suavizar as tarefas diárias, como a hora de comer ou de escovar os dentes.
Outro personagem central nas coleções da criadora é o gatinho Aderbal, que tem como missão ensinar de forma lúdica noções espaciais e temporais às crianças. “Aderbal circula pelo ambiente doméstico e, com ele, as crianças aprendem noções de localização, como atrás, em cima, ao lado. Ele ensina adjunto adverbial de lugar de forma lúdica e acessível”, explicou a autora. Além disso, o livro “É Hora de Fazer o Quê?” ensina a leitura das horas, tanto no formato analógico quanto no digital, promovendo uma experiência de aprendizado ativa e divertida.
A função da literatura infantil vai muito além de estimular a imaginação. Ela ajuda a criança a desenvolver habilidades sociais, reforçar hábitos e estabelecer uma conexão com a cultura. Em histórias como a de Teodoro, por exemplo, os pequenos são incentivados a adotar uma alimentação saudável, enquanto são introduzidos a aspectos culturais, como visitas a museus ou o resgate de brincadeiras tradicionais. Através de personagens que cativam, as histórias se tornam acessíveis e significativas, permitindo que a criança absorva conhecimento de forma leve.
Um aspecto interessante trazido por Rooma é o uso do Teodoro de pelúcia como um “apaziguador” na relação entre pais e filhos. Segundo a autora, o personagem pode ajudar a mediar momentos de conflito ou resistência em tarefas cotidianas, como tomar banho ou comer. “Às vezes, a orientação que os pais precisam dar pode parecer um pouco chata para as crianças. Mas o Teodoro pode intermediar essa relação, suavizando o momento e tornando-o mais lúdico”, afirma a autora.
Essa triangulação proposta pela escritora ilustra como os livros infantis podem ser utilizados não apenas como uma fonte de conhecimento, mas também como um meio de fortalecer os laços familiares. Ao transformar tarefas diárias em aventuras compartilhadas entre os personagens e as crianças, as histórias promovem um ambiente de colaboração e compreensão dentro do lar.
A literatura infantil contemporânea, como demonstrado pelas coleções de Dorothy Rooma, vai muito além de narrativas de entretenimento. Ela atua como uma poderosa ferramenta de construção emocional e cognitiva, permitindo que as crianças não apenas aprendam novos conceitos, mas também reforcem laços afetivos com seus pais ou cuidadores. Essa interação fortalece o papel do livro como um elo essencial no desenvolvimento das novas gerações.
Os livros para crianças são, portanto, mais do que simples histórias. Eles ensinam, conectam e apaziguam. Como os personagens de Dorothy Rooma, que servem de intermediários para suavizar relações, a literatura infantil pode ser o fio que une aprendizado e afeto, criando memórias duradouras e contribuindo para uma formação integral das crianças. Em tempos de tecnologia, o retorno ao livro impresso se torna uma oportunidade para fortalecer as relações humanas, proporcionando momentos únicos de troca e aprendizado mútuo.
As maiores filas são para transplante de rim, córneas e fígado
De acordo com dados da Secretaria da Saúde do Paraná, o Estado tem o maior número de doação de órgãos por milhão de população do País (pmp). É o estado líder nacional de transplante de rins e o terceiro em transplantes de fígado. Segundo a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), o Paraná registra 42,3 pmp, seguido de Santa Catarina com 40,7 pmp e Rondônia com 40,5 pmp.
Karoline Fernandes, de 22 anos, mora em Ponta Grossa e fez um transplante de rim aos 6 anos de idade. Ela começou a ter os primeiros sintomas de insuficiência renal quando tinha 4 anos. Do período em que a doença foi descoberta até o transplante foram dois anos de idas e vindas ao hospital; na maior parte desse tempo ela ficou internada realizando diálise peritoneal.
O rim foi doado pela sua mãe. “No momento em que minha mãe soube que era possível doar o rim dela para mim, ela não pensou duas vezes, logo fez os exames necessários e passou no teste de compatibilidade”.
Karoline explica que o processo de encontrar um doador é muito mais rápido se um familiar se dispuser a doar, como foi seu caso. Segundo ela, a fila de espera é muito demorada porque não é só preciso ter quem doe e quem receba, é preciso ter compatibilidade. Por isso, Karoline ressalta a importância da doação de órgãos, que está na possibilidade de dar mais uma chance de vida a alguém, pois muitas vezes o transplante é a última saída de um paciente. Antes disso, são feitos diversos tratamentos e apenas em extrema necessidade é realizado o transplante.
Luiz Sergio Pedroso, de Irati, teve glomerulonefrite nos rins e precisou de um transplante. Entre o diagnóstico até a hemodiálise demorou cerca de seis anos; após isso ele fez nove meses de hemodiálise, três vezes na semana, quatro horas por dia na máquina.
Durante esses anos ele foi chamado ao hospital para transplantar, mas na hora não foi compatível. Luiz tem mais três irmãos, todos com o mesmo tipo sanguíneo que ele. “Meu irmão tinha 100% de compatibilidade, mas faleceu em um acidente de trânsito e não houve chance de aproveitar os órgãos”. Sua outra irmã, que tinha 50% de compatibilidade, tinha problemas no útero e teria que fazer cirurgia para depois realizar o transplante. Em conjunto com a médica, a decisão foi realizar exames para o transplante com a terceira irmã, que tinha 25% de compatibilidade, porém na semana que estavam fazendo os exames ele foi chamado para concorrer ao rim de um possível doador, e assim realizou o transplante em maio de 2014. Hoje, 10 anos após o transplante, Pedroso nunca teve problemas com a rejeição do órgão e faz exames a cada seis meses para monitorar, além dos cuidados com medicamentos e alimentação. Ele afirma que a doação é a última chance de sobrevivência de muitas pessoas. “Para os familiares do doador, ver as pessoas transplantadas e bem com os órgãos de seu ente querido costuma ser muito gratificante também”, acrescenta.
Pedroso considera que a doação de órgãos é um ato generoso que pode salvar até oito vidas e melhorar a qualidade de vida, porém existe uma escassez de doadores, por isso a conscientização é essencial. “A desinformação leva a muitas negações de órgãos, é importante que as pessoas conversem com seus familiares sobre o desejo de doar”, ressalta.
Incentivo às doações
Dados do Registro Brasileiro de Transplantes apontam que o Paraná possui a menor taxa de recusa familiar para doação do Brasil, com 27%, enquanto a média brasileira foi de 42%. O coordenador da Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos (CIHDOTT) do Hospital Universitário (HU), Guilherme Arcaro, destaca a importância de que o desejo de ser doador seja compartilhado com a família em vida, visto que no Brasil a retirada de órgãos só pode ser realizada após a autorização familiar.
A falta de conhecimento sobre a doação de órgãos faz com que muitas famílias recusem a doação de órgão de um ente querido. Arcaro explica que muitas famílias têm dúvida sobre a declaração da morte encefálica (ME), pela confusão quanto ao estado vegetativo. “A ME é um diagnóstico irreversível de que não existe funcionamento no cérebro, enquanto no estado vegetativo, apesar de existir uma disfunção cerebral severa, existem indícios de funcionamento, que são detectáveis nos exames clínicos e complementares realizados durante a investigação da ME”.
Em Ponta Grossa, todos os hospitais devem ter Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante – CIHDOTTs instituídas, com composição de acordo com o número de óbitos ocorridos anualmente. “Os hospitais possuem profissionais que realizam diariamente busca ativa de pacientes em estado de coma arreativo ou déficit neurológico grave na busca pelo diagnóstico precoce de morte cerebral, procurando oportunizar às famílias a possibilidade de salvar vidas com o aceite da doação”, afirma o coordenador. Segundo ele, no Paraná existe um Sistema Estadual de Transplantes que trabalha em contato diário com as CIHDOTTs certificando que o processo de identificação de morte encefálica e as doações de órgãos ocorram sem imprevistos.”Nos últimos anos, o Paraná tem mantido este destaque, devemos isso também à solidariedade dos paranaenses”.
Sobre a doação entre vivos, Guilherme ressalta que ela só acontece se não representar nenhum problema de saúde para a pessoa que doa e que só podem ser doados órgãos duplos como o rim, ou partes de um órgão como pâncreas e fígado, ou ainda, tecidos como a medula óssea.
Pela legislação vigente, quem autoriza a doação em caso de morte encefálica é a família do cidadão. Além de deixar a família ciente do desejo de doar, também é possível manifestar sua vontade por meio de uma autorização eletrônica oficial que pode ser feita gratuitamente pelo site www.aedo.org.br.
Por meio desse sistema é possível escolher quais órgãos deseja doar. O documento passa por alguns processos para verificar a identidade do cidadão, como videoconferência e assinatura digital, e depois fica disponível para consulta pelo CPF do falecido, feita pelos responsáveis do Sistema Nacional de Transplantes, do Ministério da Saúde. Realizada essa autorização, em caso de necessidade, o médico poderá acessar a declaração e apresentar o desejo do paciente em óbito para a família que, caso não saiba, fica ciente, o que facilita a tomada de decisão e a autorização da doação.