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Pesquisas do IBGE excluem pessoas trans das estatísticas

Dados mostram que a comunidade transgênero vive à margem da sociedade.

A Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (ANTRA) registrou 80 assassinatos de pessoas transgênero no primeiro semestre de 2021. No entanto, esse número não consta no censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pois a apuração limita-se ao registro de homicídios divididos entre sexo ou órgão genital.
Entre muitas das estatísticas sociodemográficas presentes na plataforma online do IBGE, nenhuma abrange a comunidade transgênero, como homens e mulheres trans, travestis e pessoas não-binárias. Os seis segmentos presentes no site levam em consideração apenas o sexo ou órgão genital, sem abordar a questão de identidade de gênero.
Para Noah Louise de Souza, pessoa não-binária, a relação entre a exclusão de pessoas trans de estatísticas oficiais e a marginalização dessa população é muito clara. Ela aponta a necessidade de que essa população seja vista pelas instituições de poder: “Já passou da hora de pessoas trans serem incluídas nos censos, porquê nossa comunidade carece de amparo por parte do Estado, e o primeiro passo para que esse amparo possa existir com um grupo tão marginalizado é o recolhimento de dados para entender mais a fundo o problema.”, opina.
Noah acredita que esse problema tem relação direta com a organização capitalista em que o Brasil está inserido. “A exclusão social da comunidade trans é uma consequência que infelizmente a gente já vive e que grande parte dos nossos representantes políticos não estão preocupados em mudar. O que não é de se surpreender, porque a gente vive em sistema que para ter as pessoas no topo, tem que ter as pessoas em baixo.”

Estatísticas
Enquanto isso, o Brasil segue sendo o responsável por 40% dos assassinatos de pessoas trans que ocorrem no mundo todo. Segundo o boletim da Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (ANTRA) foram mapeadas 33 tentativas de assassinatos, 27 violações de direitos foram denunciadas e 9 casos de suicídios confirmados no primeiro semestre de 2021. Em 2020 o Brasil alcançou a maior taxa de assassinatos dos últimos dez anos. Na área da educação, 70% da comunidade transgênero não concluiu o ensino médio e apenas 0,02% encontram-se no ensino superior.
Foram registrado aproximadamente 14 casos de pessoas trans infectadas pela COVID-19, mas, de acordo com a ANTRA, o número não é preciso, pois as estatísticas seriam ainda maiores se houvesse o cuidado de identificar as pessoas a partir de suas identidades de gênero e não exclusivamente pelo sexo/órgão genital.
O dossiê completo sobre as estatísticas da população transgênero no ano de 2021 será publicado pelo ANTRA em janeiro de 2022. Os censos oficiais de proporção nacional não expressam a possibilidade de reformular o método das próximas apurações.

Texto: Maria Eduarda Kobilarz Silva 

Imagem: Arquivo Periódico

Este texto foi publicado também no site Periódico

Entidade oferece suporte aos migrantes e refugiados em PG

Desde janeiro deste ano, o projeto “Novos Rumos”, desenvolvido pela Cáritas Diocesana, empregou oito pessoas que procuram novas oportunidades na cidade

Atualmente, a inserção de migrantes e refugiados no mercado de trabalho em Ponta Grossa é um dos objetivos da atuação do projeto Cáritas Diocesana da cidade. Entre os anos de 2020 e 2021, cerca de 2.200 mil migrantes e refugiados foram atendidos pelo projeto. A maioria dos migrantes e refugiados são da Venezuela e do Haiti, mas também há pessoas da Colômbia e da Síria. Com base nas informações fornecidas pela instituição, cerca de 714 cadastros foram realizados de janeiro até a última semana de novembro deste ano no projeto “Novos Rumos”.

A proposta principal da iniciativa é inserir essas pessoas ao mercado de trabalho. O site foi inaugurado em janeiro de 2021 e Ponta Grossa serviu como piloto para aperfeiçoamento da plataforma, mas o projeto é de abrangência nacional. Na cidade, desde de janeiro deste ano, oito profissionais conseguiram empregos.“O projeto cria um contato entre o migrante ou refugiado, que está em busca de trabalho, com empresas e iniciativas empreendedoras da cidade”, explica Gislaine da Rosa, uma das profissionais do projeto.

Segundo Gislaine, ao se cadastrar, as pessoas encontram informações na plataforma para a elaboração de currículos, aconselhamento e troca de informações entre pessoas que se encontram na mesma situação. As vagas de emprego são variadas, de acordo com Gislaine, há desde oportunidades de atuação em fábricas e atendimento ao público em estabelecimentos comerciais da cidade.

Migrantes

De origem síria, Nagham Alhadi, mora há sete anos no Brasil com passagens em diferentes regiões do país. Por conta da guerra civil que a Síria enfrenta desde 2011, ela não teve outra escolha senão migrar ao Brasil com a família. Nagham revela que chegou a Ponta Grossa através do programa Mais, financiado pela comunidade cristã de Ponta Grossa. O programa atuou no Espírito Santo – local onde Nagham desembarcou após chegar da Síria, mas atualmente possui a sede em Colombo, no Paraná. O Mais leva migrantes e refugiados às cidades em que as igrejas cadastradas atuam para que sejam adotados por famílias brasileiras.

Nagham destaca como foi o tempo de adaptação na cidade, após ela e a família serem acolhidas por membros da igreja. Além do suporte financeiro e com as aulas para entender a língua portuguesa, Nagham também menciona o papel da Cáritas Diocesana para a comunidade que precisa de auxílio. “A autorização da residência nacional de minha mãe e de meus irmãos foi realizada com a ajuda da Cáritas e, sempre que possível, eu indico amigos a participarem dos programas sociais da entidade”, confirma Nagham.

Após se estabilizar em Ponta Grossa, Nagham começou a vender comidas típicas do seu país em parceria com seus pais. Atualmente, ela possui um trailer, localizado no Bairro Ronda, em que trabalha com uma amiga. Além de comercializar comidas, como kibe e shawarma, Nagham está no nono período de Enfermagem. Durante o dia ela estuda e à noite, de terça a domingo, Nagham trabalha em seu próprio negócio. 

Uma outra pessoa que foi contemplada pelo projeto foi Lydia Laktineh. Ela também é refugiada da Síria e veio para o Brasil com a sua mãe, com quem mora em Ponta Grossa por mais de três anos. Ela e a mãe vieram para Ponta Grossa para ficarem próximas da irmã de Lydia, que morava em Imbituva com o marido e com os filhos. Ao chegar na cidade, Lydia recebeu assistência para obter documentos pessoais. 

Atualmente, ela está na fila para conseguir um emprego e sobrevive das doações de pessoas e com auxílios do governo. “A minha dificuldade para encontrar trabalho, além do idioma, já que ainda não me adaptei com o português, é porque eu preciso cuidar o tempo todo de minha mãe, que é idosa”, afirma. Lydia é formada em Literatura Inglesa pela Universidade de Ba In Inglês, localizada em Damasco. Porém, o seu diploma ainda não possui validade no país. “Eu cheguei a dar aula de idiomas no país, fui tradutora, mas infelizmente precisei deixar o cargo devido a saúde da minha mãe”, destaca a migrante.

Projetos

Além do programa “Novos Rumos”, da Cáritas Diocesana, em Ponta Grossa existe o projeto Internacionalização, Cidadania e Direitos Humanos (InterMig), da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). O projeto visa acolher estudantes que são migrantes e refugiados de outros países, através de atividades e atendimentos individuais, para facilitar o período de adaptação dos alunos. Com base em dados divulgados pelo próprio projeto, quase 50 alunos intercambistas são atendidos.

Além dessas iniciativas, há as parcerias entre instituições públicas-privadas para o atendimento de refugiados e imigrantes. Em Ponta Grossa, as Secretarias Municipais Assistência Social, de Saúde e de Educação criaram uma parceria com a UEPG e com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e outras entidades para a realização do Comitê Municipal de Migrantes, Refugiados e Apátridas de Ponta Grossa. O primeiro passo do projeto foi organizar um banco de dados, que chegou a mais de 190 migrantes e refugiados cadastrados. O objetivo do comitê, que ainda está na fase inicial, é propor políticas públicas municipais voltadas à proteção de migrantes e refugiados, que residem ou só passam por Ponta Grossa.

Texto: Leriany Barbosa

OMS categoriza envelhecimento como doença na nova atualização da CID

Em 2022, a expressão “velhice” passa a ser utilizada na 11ª Classificação Internacional de Doença e especialistas na saúde do idoso posicionam-se contra a decisão da OMS.

Na mais nova atualização da Classificação Internacional de Doenças (CID), a Organização Mundial de Saúde prevê a inclusão do termo “velhice”  para o início do ano  de 2022. A CID é um catálogo de patologias utilizado por diversos profissionais da saúde para especificar doenças e seus possíveis tratamentos. O motivo pelo qual defende a OMS para inclusão do termo é de normatizar mortes pelo avanço da idade, o que deixou a comunidade médica apreensiva com as eventuais consequências de integrar envelhecimento em um catálogo de doenças.

Para o geriatra e médico da família, Cláudio Viana Silveira Filho, um dos riscos da nova classificação é de que organizações e sociedades vinculadas ao cuidado do idoso passem a ver velhice como motivo de todas as doenças e percam os reais motivos dos acometimentos epidemiológicos, “Colocar todos os idosos em um único grupo sem analisar suas particularidades é prejudicial ao próprio tratamento da saúde desses pacientes” afirma o médico.

Ao defender seu posicionamento, o Dr. Cláudio Viana comenta que no setor de geriatria o conceito de saúde é diferente comparado a outras áreas da medicina. Conforme exposto por ele, a saúde do idoso não significa a ausência de doenças e sim a capacidade funcional do paciente, ou seja, o determinante de saúde na geriatria é a capacidade do corpo em funcionar de forma sozinha.

A inclusão do termo 

A partir do dia 1º de janeiro de 2022 passa a vigorar a atualização do código R-G54 para o código MG2A, com o termo “velhice” substituindo o termo “senilidade”. A palavra antecessora, pela OMS, significa as patologias vinda das alterações fisiológicas pelo esforço da idade. Agora com nova palavra, passa a generalizar quaisquer causas de doença das pessoas com 60 anos completos ou mais.

O objetivo pelo qual a Organização Mundial da Saúde defende a substituição dos termos, é de diminuir a burocracia obituária dos falecimentos causados pelo avanço da idade. A decisão ocorreu após a morte do Príncipe Philip, o qual morreu em abril de 2021 com 99 anos, e em seu atestado de óbito decretava “morte por idade avançada”.

Segundo o Dr. Cláudio Viana, a decisão da instituição em atualizar o código para MG2A é em decorrência das mudanças demográficas que os países vêm enfrentando nos últimos anos. O geriatra explica que a mudança da pirâmide etária, ligada com a diminuição no número de nascidos vivos e também o aumento da carga epidemiológica em idosos com mais de 80 anos, é a razão da OMS normatizar a morte por envelhecimento.

Conforme os dados levantados em 2020 pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o número de idosos no Brasil com 60 anos completos ou mais chegou a contabilizar 37,7 milhões de habitantes, correspondendo a 17,7% da população geral. Na mesma pesquisa, a Dieese também aponta que pessoas com mais de 60 anos já superaram o número de crianças com até 9 anos de vida. 

A aposentada e youtuber culinária, Ana Maria Selmi Sanches, de 62 anos, fala sobre seu descontentamento pela nova classificação da OMS, sendo para ela “algo ultrajante aos idosos”. No depoimento da Ana, os melhores anos da vida começam a partir dos 60, significando o oposto de doença “A partir dos 60 anos comecei a ter liberdade para fazer minhas próprias escolhas, não tinha mais a preocupação de trabalhar para não passar fome, pude recomeçar a minha vida” complementa Ana Maria.

Campanha “Velhice não é doença!” 

A campanha denominada “Velhice não é doença”, foi feita por diferentes  profissionais da área da saúde e apoiada por representantes das sociedades civis, com o objetivo pedir aos representantes dos órgãos públicos brasileiros emitir solicitações à OMS para que a inclusão do termo não se consolide. 

Em agosto foi realizado o evento  “As novas demandas do envelhecimento e a CID-11: Perspectivas das Américas”, feito pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS), onde foram debatidos os propósitos da inclusão de velhice na CID-11. Durante o evento os participantes brasileiros mostraram forte oposição à decisão da OMS, adotando a campanha “Velhice não é doença”. O principal pedido dos especialistas brasileiros era de que a instituição reconsiderasse a publicação do novo código.

O mais recente pedido, contrário à troca dos termos, foi feito pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), na qual solicita que a OMS abra uma consulta com todos seus países membros antes da publicação da CID-11. O Ofício enviado pelo CNS considera que enquadrar envelhecimento como doença pode aumentar o estigma social e os preconceitos voltados aos idosos. Além disso, o documento aponta as possíveis interferências nas pesquisas voltadas ao tratamentos de doenças vindas do avanço da idade, como também, dificultar a coleta de dados epidemiológicos.

Texto por: Alex Dolgan

Imagem: Alex Dolgan

Cursinhos sociais preparatórios para o vestibular ainda tem vagas abertas em Ponta Grossa

A rede Emancipa e a Igreja Imaculada Conceição situadas em Ponta Grossa oferecem cursinhos pré vestibulares para estudantes do ensino médio se prepararem para os exames. As aulas já iniciaram em ambos os cursos, mas as vagas não foram preenchidas e quem tiver interesse ainda pode ingressar. O curso ofertado pela Igreja Imaculada tem um custo de manutenção no valor de 115 reais, já o curso da Rede Emancipa é gratuito.

Instituição: Rede Emancipa
Início do curso: 09/10/21
Valor de Matrícula: Sem custos
Telefone para contato: (42) 998208500
Endereço: R. Neci Nunes Ferreira, em frente ao 1428
Horário Das aulas: Sábado das 13h30 às 17
Limite de vagas: 20
Público alvo: não necessita estar obrigatoriamente no ensino médio
Obs: As vagas continuam em aberto

Instituição: Igreja Imaculada Conceição
Início do curso: 06/10/21, abrem novas vagas dia 30/11/21
Valor do curso para manter gastos do projeto: R$ 115,00
Telefone para contato: (42) 999316827
Endereço: Av. General Carlos Cavalcanti, Igreja Imaculada Conceição
Vagas: 250
Duração: Aulas até um dia antes do vestibular
Público alvo: Estudantes do ensino médio
Obs: Para saber de novas vagas é necessário entrar em contato com a instituição

A doença é o preconceito e não o HIV

Após 40 anos dos primeiros casos da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (em inglês acquired immunodeficiency syndrome – Aids) nos Estados Unidos, muitas coisas mudaram. O que era tido como sentença de morte, hoje há remédios de tratamento contínuo que permitem uma vida e saúde normais.

Não muito distante da Covid-19, o início da epidemia da Aids na década de 1980 também causou medo na população e alvoroçou a comunidade médica. Demorou a se descobrir um exame médico que identificasse o diagnóstico. As formas de transmissão ainda não eram claras e a exclusão e preconceitos recaíram sobre cinco grupos de pessoas.

Os chamados 5H – homossexuais, hemofílicos, haitianos, heroinômanos (usuários de heroína injetável) e hookers (profissionais do sexo em inglês) – foram os mais acusados pela disseminação do vírus até se descobrir que heterossexuais, sejam crianças ou adultos, passaram a se contaminar. Mas a discriminação não acabou; não só a Aids levava à morte, o preconceito também. Eram assassinados aqueles que remetiam aos 5H, não por medo, mas por ódio.

Discriminação e mortes, esse é o saldo dos estigmas que ainda estão presentes em nossa sociedade. Pouco se testa a população devido à vergonha perante o assunto, pouco se fala sobre o Vírus da Imunodeficiência Humana (em inglês Human Immunodeficiency Virus – HIV) devido à necessidade de discutir sobre sexo seguro e pouco se fala sobre como as pessoas com diagnostico positivo para o vírus vivem atualmente.

Acontece que muitos se calam quando descobrem o diagnóstico por vergonha de serem julgados, pelo medo inicial da escassez de informações. A primeira coisa que ainda se pensa é “agora vou morrer” ou até mesmo “carrego veneno nas veias”, pensamentos que estão impregnados pela falta de conversação sobre o HIV.

Os soropositivos vivem normalmente, têm direitos de trabalhar como qualquer outra pessoa, ter relacionamentos afetivos, sair para se divertir e construir uma família. Isso é o que deveria ser dito à sociedade. Ninguém deve ser julgado pela sua comorbidade, todos devem ter seus direitos reconhecidos, inclusive o direito de uma vida sem preconceito.

O Brasil, mesmo com o desmonte do Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis, ainda é um exemplo mundial de assistência para pessoas que vivem com HIV e Aids. Há medições e exames disponíveis no SUS. Do antigo AZT – coquetel de remédios que muitas vezes causava hepatite medicamentosa – ao mais novo remédio de tratamento de um comprimido diário, o Dovato composto pelo Dolutegravir e Lamivudina. Há outra forma ainda mais promissora para o tratamento, o Cobenuva é o medicamento injetável com aplicação mensal sem necessidade dos comprimidos. Importante mencionar que, seguindo corretamente o tratamento, o soropositivo fica indetectável e intransmissível.

Os testes – ainda neste ano – de vacinas contra HIV não funcionaram. Continuamos sem cura para o HIV. Já se passaram 40 anos dos primeiros casos, a ciência evoluiu, os tratamentos evoluíram, mas os estigmas presentes na sociedade ainda permanecem. O HIV não mata mais, o preconceito sim, seja em desestimular os soropositivos em continuar com seus tratamentos, seja pela vergonha em realizar os testes disponíveis no sistema de saúde público, ou em impedir que as pessoas sejam felizes.

A normalização do debate sobre HIV não mostra gourmetização do tema, mas sim a distribuição de informação. No mês vermelho de combate ao HIV, à Aids e ao preconceito, esse assunto não pode passar batido e nem ser calado.

Coluna de Leonardo Duarte é graduando em jornalismo pela UEPG, é o G do LGBTQIA+ e portador do HIV.

Coluna: “Cancelem o carnaval”: uma preocupação seletiva e racista

As redes sociais observam (ainda sem saber de onde vêm) uma escalada de postagens (algumas delas até mesmo patrocinadas) pedindo o cancelamento do carnaval de 2022 por prefeitos e governadores, apoiando-se numa perspectiva apocalíptica em relação a futuros casos de COVID-19 com a manutenção da programação das festividades. Nosso diálogo aqui não está interessado em advogar a favor da realização do carnaval passando por cima da ciência, uma vez que entendemos que quem garantirá ou não a realização da festa são os estudos e pesquisas de viabilidade e segurança sanitária. Somos provocados a rechaçar o oportunismo de muitos políticos e celebridades conservadoras em atacar uma manifestação popular cultural, política e comercial.

O carnaval é brincado de maneiras distintas Brasil afora, por isso, peço licença para refletir a partir das escolas de samba. Sobre elas, lembre-se que as comunidades não desfilaram em 2021 e muitos baluartes levantaram a voz e pediram respeito à ciência quando as autoridades buscavam encontrar algum “jeitinho” para realizar o evento.

Observem que a manifestação anticarnaval vem, majoritariamente, de uma parcela da população que se opôs à maioria das medidas de combate ao coronavírus ao longo da pandemia. Desde o uso da máscara, o isolamento, o distanciamento, a vacinação e, mais recentemente, o passaporte de vacina. Fato que nos leva a olhar essa manifestação por outra lente, percebe-se que nada mais é do que um posicionamento racista, intolerante e conservador. Utilizam-se da solidariedade pelos mortos para justificar que “não há clima para festa”. Os mesmos que outrora diziam que a vida não podia parar. O carnaval vem justamente para celebrar a vida, vida que é dura, não idealizada como prega o capitalismo e as redes sociais. Celebrar a vida também daqueles que se foram, o samba perdeu figuras ilustres e anônimas nos últimos anos, inclusive para o coronavírus e, também, não pôde despedir-se do seus, os desfiles de 2022 serão um grande gurufim em memória dos bambas que nos deixaram: Laíla, Dominguinhos do Estácio, Tantinho da Mangueira, Nelson Sargento, Mestre MUG, David Corrêa, Dona Neném, Djalma Sabiá, entre tantos outros. Ainda sobre a vida dura e a necessidade de celebração, Luiz Antônio Simas, historiador das culturas e manifestações miúdas e populares, diz que o povo faz festa não porque a vida está boa, justamente pelo contrário. A Unidos de Vila Isabel, ao homenagear Martinho da Vila, tem um verso no seu samba que resume bem o espírito do carnaval pós-pandemia: “Tão bom cantarolar, porque o mundo renasceu… Me abraçar com esse povo todo seu”.

Voltemos à compreensão que fundamenta a campanha racista e intolerante “Cancelem o carnaval”: as escolas de samba e o carnaval de rua, na sua gênese, são obras do povo preto, marginalizado, periférico. Evoca liberdade do corpo e de expressão, contra a dominação e domesticação. É uma campanha que aciona a intolerância religiosa visto que o pentecostalismo não aceita uma manifestação que não nasce dentro dos seus fundamentos, veja as escolas de samba surgindo dos terreiros de Candomblé, saudando seu Orixá nos toques da bateria, que traz toda ancestralidade na saia da Baiana, que ensina, aprende e se estrutura com as sabedorias de África. Ou seja, uma festa que uma sociedade racista, escravocrata e fundamentalista não suporta.

Dos 26 enredos que estão sendo preparados para tomar a Sapucaí, no mínimo 16 tem ligação explícita com o povo negro. Figuras como Milton Gonçalves, Chica Xavier, Mãe Stella de Oxóssi, Besouro Mangangá, Candeia, Cartola, mestre Delegado e Jamelão serão homenageados. 2022 será um ano para “empretecer o pensamento”, como defenderá na Avenida a Beija-Flor de Nilópolis.

O que se nota é uma preocupação pandêmica seletiva, justa para aqueles que sempre defenderam as medidas de proteção e combate ao vírus e também uma preocupação nossa, tão nossa que há meses, dirigentes, autoridades e cientistas vêm discutindo como e com quais indicadores o Rio de Janeiro poderá receber os foliões. Preocupação nossa, pois o carnaval não é só festa, é ancestralidade, cultura, história, pedagógico, e também turismo, emprego. Cuidar dos nossos, de quem faz e curte a festa é primordial. 

Com essa preocupação, a Comissão Especial de Carnaval da Câmara dos Vereadores acredita que o Rio está perto de atingir os critérios estabelecidos para que as festividades aconteçam em 2022, índices que observam desde a estrutura e disponibilidade da Saúde da cidade para atender a população até a porcentagem de cariocas vacinados. Prevê-se que na época do carnaval quase metade da população e 70% dos adultos estarão vacinados com a terceira dose. Recomendam ainda o passaporte da vacinação para turistas brasileiros e do exterior, medida que ainda não foi implementada pelo governo Bolsonaro e muito atacada por seus seguidores que evocam o “direito de ir e vir”.

Sabemos que não é proveitoso deslocarmos o debate para olhar o quintal ao lado, mas é uma reflexão que fica guardada as devidas proporções: estádios, teatros, shows, igrejas, autódromos estão funcionando com 100% da capacidade de público e não há oposição pelos críticos do Carnaval. Réveillon, Futebol, Rock in Rio, Fórmula 1 e rodeios são medidos com a mesma régua? O carnaval com grandes aglomerações só acontece em alguns pontos do país. As festividades natalinas, por exemplo, não. Pelo contrário, ocorrem em todos os cantos do Brasil, desde cidades pequenas do interior até grandes metrópoles. Haverá cancelamento das festas de fim de ano? 

“Cancelem o carnaval” é uma manifestação racista, intolerante e de classe. O capitalismo impôs que milhares de pessoas pegassem transporte público lotados todo dia durante a pandemia e no auge da contaminação (como foi em março de 2021), para que não houvesse mortes de CNPJ. Hoje, querem o contrário, justamente quando a ciência sinaliza a queda na transmissão, no número de casos ativos e no de vítimas. É escancarar e reafirmar a postura anticiência que levou a mais de 600 mil mortes no Brasil. Estavam contra ela no começo da pandemia e continuam jogando contra a ciência no seu processo de superação. 

Outro fato importante, celebra-se a retomada do turismo no país. A mídia capitalista sinaliza os “hotéis lotados” para os feriados e festas de final de ano. Carnaval é um ramo de trabalho que emprega diretamente pessoas o ano inteiro, como é o caso dos barracões das escolas de samba, mas também criam postos de trabalho temporários, veja os comerciantes de bebida nos blocos “cerveja 3 por 10”, por exemplo, gerando e injetando um montante considerável de dinheiro na economia do país. Mas, aparentemente, não é um trabalho necessário? Visto que não se valoriza, nem reconhece, tampouco legitimam.

Para finalizar, o jornalismo hegemônico comprou a ideia. Exploram o fato de que mais de 70 cidades paulistas, por exemplo, já cancelaram a festa. Mas de maneira pouco crítica observam qual a densidade e penetração do carnaval nesses municípios. Quais cidades são essas? Havia Carnaval antes da pandemia? Em que proporção? Qual posição político-ideológica da gestão da Prefeitura? Muitos pequenos municípios vêm há anos cancelando as festividades carnavalescas por motivos financeiros. Festividades que se resumem, na grande maioria, a um “show” na praça pública. Será que estão preocupados em cancelar aquilo que realmente aglomera gente em seus municípios: rodeios, shows sertanejos, cultos, eventos gospel, etc?

Fato é que, graças à vacinação, o que se vivencia é um ambiente mais seguro e possível de realizar a festa. Caso as autoridades científicas e sanitárias apontem a necessidade do cancelamento, não tenham dúvidas que as escolas, os sambistas e os foliões vão respeitar como respeitaram em 2021, pois têm compromisso com a vida, com a arte e a cultura.

Fica o desejo que em 2022 celebremos a vida, a cultura popular, a arte negra e periférica e coloquemos nossos corpos (vacinados) na rua em movimento.  

Colunista: Felipe Collar Berni 

é jornalista, professor, pesquisador e educado pelas escolas de samba

Relatório da CPI Covid-19 e os Direitos Humanos Violados

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O relatório final, publicado no dia 26 de outubro de 2021, além de trazer todos os detalhes da CPI ( investigação conduzida pelo poder Legislativo, realizada na casa parlamentar como local para ouvir todos os depoimentos), identifica quais indivíduos foram indiciados e por quais crimes. 

Dentre os principais crimes que o presidente Jair Bolsonaro está sendo indiciado, estão: prevaricação; charlatanismo; epidemia com resultado morte; infração a medidas sanitárias preventivas; incitação ao crime e falsificação de documentos particulares. 

Com relação ao Caso da compra da vacina indiana, Covaxin; estão sendo indiciados Francisco Maximiano, (falsidade ideológica, uso de documento falso e fraude em contrato); Danilo Trento, diretor de relações institucionais (fraude em contrato); Emanuela Batista de Souza Medrades, diretora-executiva e responsável técnica farmacêutica da Precisa, e Túlio Silveira, consultor jurídico ( os dois por falsidade ideológica, uso de documento falso e fraude processual).

O plano de saúde, Prevent Senior, por conta das suas ações na pandemia, relacionadas a prescrição do “kit covid”, também resultou em indiciamentos. Dentre eles estão, a médica Daniella de Aguiar Moreira da Silva, por homícidio, na categoria de “omissão do dever funcional” no tratamento de pacientes com covid. E o médico Flávio Adsuara Cadegiani, acusado de crime contra a humanidade, após seus estudos sobre os efeitos da proxalutamida, em que 200 pessoas teriam sido mortas em consequência. 

A equipe do Elos separou os principais direitos humanos violados na pandemia, a partir dos 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, respectivamente no infográfico abaixo:

Coluna | Entre liberdade de expressão e homofobia: existem limites!

Recentemente, o jogador de vôlei Maurício Souza fez algumas postagens em relação à bissexualidade de um personagem de histórias em quadrinhos. A postagem gerou uma movimentação nas redes sociais, na qual diversas pessoas, por um lado, pediam uma retratação e um pedido de desculpas por parte do jogador, ao afirmar que sua fala ultrapassava os limites da liberdade de expressão e se encaixava em um crime propriamente dito. Por outro lado, vozes conservadoras afirmavam que se trata do exercício da liberdade de opinião que deveria ser respeitada.

Como resultado, o jogador foi demitido do Minas Clube – time no qual jogava profissionalmente – que afirmou não compactuar com as falas do jogador e defender a inclusão, a diversidade e demais causas sociais.

Diante deste imbróglio, surge o embate jurídico-social que permeia as discussões atuais: tais falas são manifestação da liberdade de expressão ou crime de homofobia? 

De imediato, é importante deixar evidenciada nossa leitura sobre este caso, e afirmamos categoricamente que estamos diante de uma hipótese de LGBTfobia. Não se trata de uma mera suposição, mas de uma análise jurídica, política e social.

Isto, evidentemente, não significa que prezamos por uma liberdade de expressão mínima ou que somos contrários a ela. Significa, de maneira oposta, que defendemos a maior liberdade de expressão possível, haja vista que isto implica em mais democracia. Todavia, não se pode interpretar a liberdade de expressão ou opinião como licença para expor pensamentos que ferem o próprio direito de liberdade – no caso em tela, a liberdade de ser quem você é e da livre orientação sexual.

A liberdade é um direito conquistado em árdua luta durante anos, sendo assentada definitivamente como um direito no pós-revolução Francesa e com a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. Desde então, é possível afirmar que tal direito passa por atualizações e reinterpretações, que permitem sua adequação à realidade atual e constantes mudanças na sociedade. Trata-se de um direito humano, protegido por diversos tratados internacionais e, na Constituição da República Federativa do Brasil, presente no art. 5º como um direito e garantia individual.

Ainda, importante mencionar que a liberdade de expressão é uma das variadas ramificações do direito de liberdade. Nela, todo indivíduo tem o direito/poder de se valer de seus pensamentos, sua formação pessoal, para expressar o posicionamento que entender pertinente de acordo com suas convicções. Neste sentido, José Afonso da Silva compreende que se trata da liberdade individual de adotar atitude intelectual que lhe aprouver, seja do pensamento íntimo, seja da tomada de posição política, dentre outros aspectos.

É mister ressaltar a contribuição do direito à liberdade de expressão como forma de garantir a democracia. Ao positivá-la, a Constituição Federal de 1988 assegura que os indivíduos possam se manifestar de forma livre, sem nenhum tipo de censura prévia. Todavia, é preciso ressaltar que o direito à liberdade não é licença/prerrogativa para disseminar preconceitos e, sobretudo, violar os demais direitos previstos na própria Constituição.

Em uma interpretação sistemática do texto constitucional, em especial na leitura do artigo 5º, incisos IV e V, o direito de liberdade de manifestação de pensamento é plenamente protegido, com a ressalva de que se veda o anonimato – ou seja, cabe ao indivíduo se identificar ao exteriorizar seu pensamento – e também sendo cabível o direito de resposta e consequente indenização.

Defende-se, em consonância com a Constituição e com a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que este direito não é absoluto, que encontra limites no conjunto de direitos da Carta Constitucional, uma vez estes devem ser interpretados concomitantemente. Assim já afirmava o Ministro Celso de Mello, em 2003, e sede de Habeas Corpus impetrado por Siegfried Ellwanger. Nas palavras do Ministro:

“O direito à livre expressão do pensamento (…) não se reveste de caráter absoluto, pois sofre limitações de natureza ética e de caráter jurídico. Os abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento, quando praticados, legitimarão, sempre “a posteriori”, a reação estatal, expondo aqueles que os praticarem a sanções jurídicas, de índole penal ou de caráter civil.”

Há que se ressaltar, ainda, que à luz do próprio sistema internacional de proteção de Direitos Humanos, o entendimento de restrição à liberdade de expressão segue o mesmo sentido. Ainda que a Convenção Americana de Direitos Humanos insira o direito à liberdade de expressão como um dos objetos de proteção do tratado, em seu artigo 13, a própria jurisprudência da Corte já se manifestou que a restrição à liberdade de expressão pode acontecer, desde que seja estritamente necessária e baseada na proporcionalidade. O exercício de direitos estabelecidos na Convenção, portanto, devem se harmonizar com o bem comum. Ainda, a posterior responsabilidade deve estar consonante com a necessidade de respeitar e garantir a reputação dos demais direitos, garantindo assim a seguridade nacional.

Não se deve olvidar, ainda, que a própria Corte brasileira já equiparou a homotransfobia ao crime de racismo, na ADO 26. Neste sentido, declarou que, enquanto o Legislativo não tipifica a homotransfobia, deve-se aplicar o crime previsto na Lei 7.716/89, que tem como fundamento o preconceito, manifestado em suas variadas formas. Trata-se de uma interpretação conforme a Constituição. 

É preciso deixar claro que a homotransfobia não se funda apenas em ataques diretos à pessoas, mas também em situações genéricas que perpetuam um preconceito que é estrutural em nossa sociedade. Diante destes fundamentos, parece claro que Maurício não emite uma “opinião” baseada na liberdade, mas sim comete um crime que reverbera em violências cotidianas. Logo, se esta opinião afronta a garantia de outros direitos humanos, a responsabilização e restrição do direito à liberdade parecem se fazer presente como limitadora da instabilidade democrática causada pelas opiniões em desarmonia com o texto constitucional e com os próprios tratados internacionais de Direitos Humanos.

A título informativo, somente em 2020, segundo o Grupo Gay da Bahia, foram registradas 237 mortes violentas contra a população LGBTQIA+, baseadas exclusivamente por sua orientação sexual/identidade de gênero. Tais dados são levantados pela Organização justamente porque não existe um mecanismo estatal que compute estas formas de brutalidade contra a população LGBTQIA+, o que pode suprimir ainda mais casos violentos.

Portanto, manifestações que partem de uma suposta liberdade de expressão, como o caso em tela, mas que são desarmônicas com o contexto jurídico de proteção de direitos fundamentais, não devem ser consideradas como expressão de liberdade, cabendo inclusive eventual responsabilidade. É preciso combater tais reproduções e, especialmente, garantir que a liberdade sexual não seja cerceada por questões morais/individuais. Chega de preconceito!

Esse texto também foi publicado no Portal Migalhas.

#349 Boletim Covid-19 | Boletim Covid-19 encerra as atividades

Boletim Covid-19 – informação contra a pandemia – uma produção do curso de Jornalismo da UEPG.

Reportagem: Lucas Ribeiro e Vinícius Sampaio
Edição: Daniela Valenga e Eder Carlos
Professores responsáveis: Cíntia Xavier e Rafael Kondlatsch


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